Uma das lições que se pode tirar da pandemia do novo coronavírus é que todos, sem exceção, precisam ter um fundo financeiro para emergências. Apesar disso, segundo a última pesquisa Datafolha, de abril, só 28% dos brasileiros tinham reservas para se sustentar por mais de três meses caso tivessem salários reduzidos, contratos de prestação de serviço cancelados, negócios paralisados ou até mesmo fossem demitidos.
O fato é que o salário acabar antes do final do mês é a realidade da maioria, mais precisamente para 60% da população, segundo levantamento da CNDL (Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas) e do SPC Brasil (Serviço de Proteção ao Crédito), feito em setembro do ano passado. Nele, 61% afirmavam não aproveitar a vida como gostariam por administrar mal o dinheiro e 57% não planejam ações para garantir a longevidade financeira.
Viver no limite do orçamento tem sido a realidade de muitos brasileiros e conseguir tirar uma parte dos ganhos mensais para guardar ou investir acaba sendo uma tarefa ainda mais complicada: apenas um terço (29%) diz que consegue, às vezes, fazer um fundo financeiro para emergências, e 1 em cada 10 guarda alguma quantia sempre ou frequentemente.
Para Nilton Molina, presidente do Instituto de Longevidade Mongeral Aegon, “o brasileiro foi levado a entender que não precisava poupar”, por ter saúde e aposentadoria garantidos pelo Estado. Então, avalia, a mensagem sempre foi “ganhe e gaste; e não ganhe, gaste, mas guarde e se proteja”.
“Mas, agora, com as crises fiscais escancaradas, as sucessivas reformas da Previdência e todo o conteúdo disponível sobre finanças na internet, não fazer planejamento financeiro passa a ser – mais do que nunca – responsabilidade de cada um que ainda não tomou nenhuma atitude nesse sentido”, avalia o especialista em finanças pessoais Hirbis Girolli, especialista da MAG Investimentos.
O que é o fundo financeiro de emergência
“Momentos inesperados acontecem na vida de todos e, para passar por eles da melhor forma, é muito importante um planejamento para se ter um fundo financeiro de emergência”, pontua Otavio Machado, especialista em educação financeira da Creditas.
“Com ele, a pessoa guarda uma quantia para que possa continuar pagando suas despesas por um período, caso deixe de ter a renda prevista. Afinal, ninguém consegue prever uma demissão, gastos extras com remédios ou o pagamento do conserto de um carro ", exemplifica.
Girolli complementa. “Veja o que aconteceu com muitos aposentados no setor público, tais como os inativos do Rio de Janeiro e de outros governos locais. Muitos desses governos estão em situação financeira extremamente difícil e, em determinado mês, avisaram: não há dinheiro para pagar servidores, ativos ou inativos”.
De quanto deve ser o fundo financeiro de emergência
O fundo financeiro deve ser um valor suficiente para cobrir todos os seus gastos médios mensais, exceto qualquer tipo de poupança. “Em uma emergência, é natural que a poupança para a independência financeira e para qualquer outro projeto futuro seja suspensa”, diz o especialista.
“Qualquer gasto não previsto que não possa ser coberto por um seguro deve ser suportado pelo fundo financeiro de emergência. Mesmo que você tenha um bom plano de saúde, por exemplo, gastos com medicamentos caros podem provocar graves desequilíbrios financeiros, em caso desse tipo de imprevisto”, exemplifica.
Os especialistas recomendam que o fundo financeiro garanta, no mínimo, três meses de despesas, conforme a realidade de cada um – mas o ideal são seis. Por exemplo, se o custo de vida da família for R$ 5.000 reais ao mês, o ideal é que a reserva de emergência seja de, no mínimo, R$ 15 mil.
No caso de pessoas que têm uma remuneração variável, é importante que a reserva seja ainda maior, por não contar com auxílios, como o seguro desemprego e o FGTS. “Os não assalariados devem atingir o mais cedo possível o estágio 2 da independência financeira [leia abaixo], onde o valor para cobrir os gastos recorrentes do mês (exceto qualquer tipo de poupança/investimento) já esteja na conta desde o mês anterior”, ensina Girolli.
Longevidade financeira: os 4 estágios da independência financeira
Os estágios rumo à longevidade financeira são o resultado esperado de ações permanentes de ganhar mais, gastar bem, poupar certo e investir melhor. São 4 marcos que comprovam que a pessoa está na direção certa, ou seja, que deixou de viver apenas para pagar contas.
Esses grandes objetivos são a independência e a liberdade em relação:
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À família: você não depende de ninguém para pagar suas contas, mesmo que ainda opte por morar de graça com seus pais.
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Ao ciclo salarial: você não depende do salário do mês para pagar suas contas, porque está sempre um salário à frente.
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Ao seu atual emprego: você não precisa se agarrar a todo custo aos seu atual trabalho para pagar as contas, tornando-se mais autêntico e confiante no trabalho.
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À renda do trabalho: você não precisa mais do salário para pagar as contas, podendo escolher quando e onde trabalhar.
Ao olhar para cada degrau acima, fica a pergunta: “Onde está o fundo financeiro para emergências? “Na medida em que caminha da independência em relação ao ciclo salarial para a independência em relação ao seu atual trabalho, você formará sua reserva de proteção para emergências. Ela será uma consequência desse processo de evolução”, diz Girolli.
Por isso, se você é autônomo, empreendedor, freelancer ou profissional liberal, considere que você tem um negócio e sua renda vem dele. Daí defina um fixo que você pode tirar desse negócio, mesmo que você seja uma “eupresa”, aquilo que chamam lá fora de solo entrepreneur. Segundo o especialista da MAG, “uma das maiores causas de desestabilização financeira entre esses profissionais é passar a ganhar mais durante um período e logo redefinir seu padrão de vida para cima em função dessa renda muitas vezes transitória’’.
Da mesma forma que nós, como pessoas físicas, precisamos de um fundo financeiro de emergência, um negócio também precisa. “Nos EUA, alguns empreendedores chamam isso de open doors. Mais ou menos o seguinte: é a sua capacidade de ficar de portas abertas mesmo em situação de perda temporária de receita”, o que aconteceu na pandemia.
Em outras palavras: o seu negócio deve ter uma reserva de seis meses também. Se ele envolve outros colaboradores além de você, com custos mais complexos, precisará de uma reserva ainda maior.
Como formar o fundo financeiro para emergências
O primeiro passo é analisar e organizar o orçamento mensal ponto a ponto, para identificar quais são os gastos essenciais e quais não são. “Neste momento, é importante reorganizar dívidas, caso as tenha, entender juros e prazos e identificar se as parcelas estão com valores praticáveis ou se deve-se tentar renegociar. Colocar tudo em uma planilha pode ajudar nessa organização”, ensina o especialista da Creditas.
Quando começa o mês, “o mais comum, para muitas pessoas, é pagar primeiro todos os gastos fixos; em seguida, partem para os gastos flexíveis ou os relacionados com a qualidade de vida. E, enfim, ficam por último os investimentos no futuro: aquele dinheiro que pode ser reservado para se ter um bom padrão de vida ou realizar um projeto importante”, observa. “Porém, o ideal é inverter esta lógica e colocar os investimentos em primeiro lugar, pois, caso haja imprevistos, a pessoa não será pega de surpresa.”
Conseguir tirar uma parte dos rendimentos para poupar acaba sendo uma tarefa mais complicada em tempos de pandemia. Mas os especialistas ensinam um caminho: aproveite a redução – quase que mandatória – de alguns gastos, como transporte e sobretudo lazer, para iniciar o fundo financeiro de emergência.
“É simples, mas não é fácil. A chave para começar é ter pelo menos um mês de renda líquida mensal na frente, guardada. Se você poupar 20% de sua renda líquida mensal durante cinco meses, você já atinge esse estágio. Durante esse tempo, você já internalizou o hábito da poupança. Com isso, a jornada restante para um fundo de emergência fica mais fácil”, diz Girolli.
Onde investir o fundo financeiro para emergências
O fundo financeiro para emergências é um dinheiro que deve ser aplicado em investimentos que não contenham riscos e que tenham liquidez imediata, ou seja, que possa ser resgatado em, no máximo, um dia.
Pode estar investido, por exemplo, em um CDB pós-fixado que renda próximo a 100% do CDI ou em um Fundo Renda Fixa DI, com taxa de administração menor que 0,30% ao ano. “Pessoalmente, sou um grande fã de fundos porque, de forma simples, você pode comprar duas coisas relativamente baratas: a união com outros investidores, aumentando seu potencial de ganhos; e a inteligência de gestores e especialistas 100% dedicados ao assunto.”
O Tesouro Selic, segundo ele, também é uma opção, “mas o governo já suspendeu a plataforma de acesso algumas vezes durante momentos de instabilidade, o que é ruim se você precisa sacar o dinheiro rápido”. Além disso, diz o especialista da MAG, “existe uma taxa de 0,25% sobre o montante investido, que é cobrada pela B3, a instituição autorizada pelo governo a operar os processos de compra e venda”.
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