Há dez anos, toda quarta-feira, ela acorda bem cedo, se arruma e, às 5h, pega o carro para cruzar a cidade de São Paulo da zona oeste rumo à leste. Por volta das 5h40, já está trocando fraldas, dando mamadeiras e cuidando de cerca de dez bebês de até 5 meses.

Ela é Leda Joana de Bartolo Finardi, 77 anos. Trabalhadora voluntária “profissional”, desde os 15 anos se dedica a alguma causa social. Na juventude, dava aulas de catecismo em escola pública. Depois, já casada e com os três filhos estudando, começou a trabalhar em creches e hospitais, sempre sem ser remunerada.

Leda é uma das mulheres que ajudam a manter tudo em ordem na Casa Santa Bakhita, único lar transitório da capital paulista que recebe bebês com até 1 ano de idade. São crianças que foram retiradas de seus pais pela Justiça, muitas vêm da região da Cracolândia, algumas foram abandonadas. Chegam abaixo do peso, doentes e lá ganham carinho e cuidados.

No lar transitório, que tem capacidade para 20 bebês, ficam até que surjam pais adotivos ou que a Justiça decida encaminhá-los a algum parente. Se permanecerem no local até completarem 1 ano, são acolhidos em outras casas da ONG Nossa Senhora do Bom Parto, da qual a Santa Bakhita faz parte.

A emoção é o fio condutor desse trabalho, mas o profissionalismo tem de andar lado a lado. Leda se lembra do quanto chorou, junto com toda a equipe, quando o primeiro bebê morador da Santa Bakhita foi adotado: “Foi como uma perda para nós. Não sabíamos lidar com aquele tipo de situação, de emoção. Foi sofrido. Você se apega à criança, sabe que ela não tem família, você passa a ser tudo para ela: mãe, tia, avó, amiga… E, de repente, ela vai embora. Hoje não é mais assim, fico muito feliz com as adoções. Os pais são pessoas maravilhosas, é uma ação muito nobre. Choro, só se for de alegria!”

“Eu digo que todo mundo pode ser voluntário em qualquer idade. Faz bem para a alma, o que você recebe em troca é tão grande…”

Viúva há 17 anos, a voluntária diz que sempre teve o apoio do marido e que sua atuação é motivo de alegria na família, incluindo os três netos. “Eles contam para todo mundo, falam da minha dedicação, dizem que sentem orgulho de mim. Eu digo que todo mundo pode ser voluntário em qualquer idade. Faz bem para a alma, o que você recebe em troca é tão grande…”

Quando não está trabalhando no lar transitório, Leda está “cuidando da casa, fazendo operações bancárias pela internet ou viajando”. “Adoro viajar, mas sempre compenso minhas ausências no trabalho”, faz questão de esclarecer.

voluntária Leda, que iniciou trabalhos voluntários aos 15 anos de idade, dando aulas de catecismo em escola pública; Crédito: Paula Lago

Quando algo acontece e não pode ir cuidar dos bebês, a sensação é estranha, diz. “Só peço a Deus a continuar tendo muita saúde para continuar fazendo esse trabalho da melhor maneira até o fim. Quando vou além do meu dia combinado, é a melhor coisa. Cada dia de trabalho com eles é uma oportunidade nova na vida”, afirma.

Na ONG Nossa Senhora do Bom Parto, Leda é voluntária há 25 anos e já fez um pouco de tudo, até trabalhou na parte contábil. Mas é com as crianças, e, especialmente, com os bebês de até 6 meses que ela se realiza.

“Os menorzinhos são meus preferidos, trabalho diretamente com eles. Faço estimulação, massagem, canto, dou banho, brinco, converso... Meu papel é o de passar amor como o de uma avó mesmo. Sempre uso o termo avó. E espero que os bebês sintam isso, que receberam muito carinho nesta fase da vida, depois do sofrimento que viveram. É um amor que transborda.”

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