Quem nunca parou para ajudar a mãe, o pai, os avós ou qualquer idoso a realizar alguma tarefa no celular ou no computador? Em qualquer que seja a família, de norte a sul do país, as dúvidas sobre tecnologia de pessoas mais velhas geralmente se repetem, e vão desde procedimentos simples, como enviar arquivos pelo WhatsApp, a processos mais complexos, como instalar/desinstalar programas no computador ou no celular ou realizar compras e pagamentos online.

Tanto interesse pela modernidade fez com que o Brasil ganhasse 4,8 milhões de novos internautas acima dos 60 anos na última década, saltando de 360 mil em 2008 para mais de cinco milhões de usuários seniores, grupo que movimenta mais de R$ 330 bilhões por ano.

Os números chamaram a atenção do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil), que em parceria com a Confederação de Dirigentes Lojistas (CNDL), realizou um estudo para mapear o estilo de vida dos 60+ e sua relação com a tecnologia.

O resultado mostrou que mais da metade dos entrevistados (53,9%) têm acesso à internet. Desses, 39,3% acessam diariamente e 19,1% realizam compras online com certa frequência. A pesquisa também identificou as redes sociais e aplicativos de celular mais utilizados, ficando o Facebook com a liderança (77,3%), seguido pelo WhatsApp (73,5%) e pelo Youtube (39,8%).

Dúvidas sobre tecnologia das pessoas mais velhas

Os números poderiam ser ainda mais expressivos se houvesse um maior suporte tecnológico a esse público. Para fazer a sua parte, o estudante de História Guilherme Gutierrez Saldanha, de 29 anos, criou o projeto Neto Virtual.

“Começou há uns anos, na minha casa lá em Uruguaiana”, relembra Guilherme. “Um velho amigo da família, Ubirajara Raffo Constant, famoso artista local do Rio Grande do Sul, tinha ganhado um computador dos seus filhos, com sinal de internet sem fio, e fizeram um perfil no Facebook para ele. Foi um presente e tanto, porque o ‘Bira’ tinha problemas de audição e não tinha aparelho auricular”.

Guilherme conta que o artista tinha muitas dúvidas sobre tecnologia e não entendia como funcionava o computador, acreditando se tratar de uma mistura de máquina de escrever e televisão. Aos poucos, o amigo foi domando a máquina, descobrindo o perfil de velhos amigos nas redes sociais, vendo que era possível mandar recados, ou “cartas virtuais”, como ele costumava dizer.

“Eu era o cara que sentava do lado dele e ia ajudando, indicando os caminhos e facilitando sua navegação. Logo, o Biratuxo, como era conhecido, viralizou”, comemora Guilherme. “No início, achei engraçado, mas aos poucos fui vendo que ele desenvolveu um jeito próprio de navegar. Conseguia se relacionar, interagir e ter uma vida social na internet, limitada entre Facebook e Word, mas seu desenvolvimento era notório”.

“Internautas não têm paciência ou tempo para ensinar seus pais e avós a entrarem nas redes”

A evolução do amigo fez com que Guilherme se desse conta de que muitas pessoas mais velhas ainda não tinham uma vida social na internet, não por falta de tempo ou de disposição, mas porque sentiam-se intimidadas e tinham muitas dúvidas sobre tecnologia. “Internautas não têm paciência ou tempo para ensinar seus pais e avós a entrarem nas redes”, reclama.

Dúvidas sobre tecnologia

Guilherme Saldanha, criador do Neto Virtual, ajuda pessoas mais velhas com dúvidas sobre tecnologia.

Foi aí que surgiu a ideia do Neto Virtual, um serviço de acompanhamento presencial e virtual ao público 60+, visando à inclusão digital por meio do entretenimento (internet, tecnologias, redes sociais e lazer). Guilherme decidiu pôr em prática sua experiência de educador e se tornar um “neto” paciencioso, que escuta as dúvidas sobre tecnologia desses avós e os ensina, sem pressa, a navegar num mundo infinito e cheio de opções.

Funcionando desde 2015, o Neto Virtual já atendeu a cerca de 60 avós virtuais, dos quais 70% ainda mantêm contato diário. “São vários casos, de pessoas que confiam no nosso trabalho e que ligam quando precisam de uma ajuda com o celular, ou quando estão com alguma dificuldade de uso e até quando precisam de uma companhia”, explica. “Ser um Neto Virtual, além de exigir paciência, é necessário ter compreensão com as particularidades das pessoas. Cada pessoa possui suas características, por isso é importante uma leitura da personalidade do cliente, o que ela gosta, quais seus interesses e limitações, como tornar a internet agradável e útil”.

E Guilherme atende a todos esses clientes sozinho, embora muitas pessoas demonstrem interesse em participar do seu projeto. A intenção, segundo o empreendedor, é futuramente fazer parcerias para ampliar seu quadro de clientes e fomentar mais entretenimento para o público 60+. Além disso, faz parte do prognóstico do projeto fazer cursos de capacitação de ensino para esse grupo.

Outra iniciativa também ganhou bastante destaque nas redes sociais, só que dessa vez envolvendo o estudante de Direito Alexandre Drabecki, de 23 anos, e a avó de sua namorada, a Dona Iracema, de 73 anos, que havia acabado de ganhar seu primeiro celular.

“Ela não sabia mexer em absolutamente nada e pedia mil vezes ajuda pra fazer qualquer coisa”

“Ela não sabia mexer em absolutamente nada e pedia mil vezes ajuda pra fazer qualquer coisa”, relembra Alexandre. Ele conta que, ao frequentar a casa da namorada nos fins de semana, percebia que as pessoas acabavam perdendo a paciência com Dona Iracema por explicar a mesma coisa repetidas vezes. Foi aí que Alexandre teve uma ideia.

“Pensei em fazer um manualzinho básico pra ela, com informações desde como procurar o ícone do WhatsApp no celular a ver mensagens, áudios e responder também, bem básico, passo a passo”, explica o jovem. “Fiz durante aproximadamente meia hora do meu sábado à noite, enquanto ela estava na igreja. Usei o que tinha na hora na casa da minha namorada”.

Dúvidas sobre tecnologia

Manual criado por Alexandre Drabecki para ajudar avó da namorada.

O resultado? “Ela simplesmente amou! Agradeceu muita a disponibilidade e paciência em ajudar”, comemora Alexandre emocionado. “Eu sempre gostei de conversar e estar ali com idosos. Ela levou até pra uma viagem o manual esses dias [Risos], está aprendendo aos poucos”.

Alexandre postou a ideia em uma rede social, que rapidamente viralizou. Hoje, são mais de 81 mil curtidas. E aí veio uma segunda ideia: disponibilizar o material gratuitamente para o download de outras pessoas com a mesma dificuldade.


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O sucesso é tamanho que ele já pensa em uma versão atualizada do manual. “Com certeza, ficou muita coisa de fora. Eu fiz o bem básico pra ela. Já estou montando um completo do WhatsApp, e tenho o projeto de outras redes sociais também”, comemora.

Dúvidas sobre tecnologia

Alexandre Drabecki ao lado de Dona Iracema durante entrevista para TV. 

Recentemente, Alexandre foi procurado por uma editora que propôs uma parceria para lançamento do manual em escala nacional já nos próximos meses. Aguardem que vem coisa boa por aí!

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