O aposentado Sérgio de Souza Pinna, de 71 anos, não precisa mais ir às urnas – quem tem menos de 18 e mais de 70 anos de idade tem voto facultativo no Brasil. No entanto, ele diz que faz questão absoluta de exercer esse direito nas eleições deste ano. “O momento político que vivemos hoje é muito delicado”, justifica. “Temos que ver quem vamos colocar no poder, e isso terá, inclusive, influência direta em minha vida. Será que a Previdência terá dinheiro para me pagar daqui a quatro ou cinco anos?”
A visão de Sérgio, que mora em Jacarepaguá, Zona Oeste do Rio de Janeiro, mostra algo nem sempre comum entre as pessoas de mais idade: a consciência de seu poder de decisão sobre os rumos da nação, dado o aumento da longevidade no país e no mundo. “Existe um percentual bastante elevado de pessoas idosas que pode fazer a diferença nas eleições”, afirma Marília Berzins, presidente do Olhe – Observatório da Longevidade e especialista em envelhecimento. “O próprio segmento não sabe do poder que tem nas urnas.”
Segundo estatísticas da Justiça Eleitoral, o número de eleitores no Brasil com mais de 70 anos aumentou 11,12% em relação a 2014: passou de 10.824.810 para 12.028.495 de pessoas, o que representa 8,17% do total. A alta geral da quantidade de pessoas aptas a votar no país foi de 3,14% no período, somando, hoje, 147,3 milhões de eleitores.
A sua cidade é um bom lugar para envelhecer? Clique aqui e confira o Índice IDL.
Sérgio diz perceber a falta de engajamento dessa parcela da população entre os próprios amigos de sua faixa etária. “Dizem que não fazem questão de votar, que já estão no final da vida”, conta. “Já eu digo que me aposentei do trabalho, mas não da vida.” Mas nem de uma função social produtiva ele abriu mão, na verdade: tem um táxi e afirma que não quer “ficar em casa”. “Sempre estou procurando alguma coisa para fazer, para ocupar minha mente”, diz.
Número de eleitores no Brasil com mais de 70 anos de idade aumentou 11,12% em relação a 2014; Crédito: Marri Nogueira / Agência Senado
Ser politizado sempre foi uma característica de sua personalidade, por sinal. “Já fui presidente de clube de futebol de bairro e de cooperativa de táxi”, lembra. “Quando representava os taxistas, via muitas coisas erradas no poder público, e sou do tipo que gosta de ver as coisas certas. Minha maior riqueza é o orgulho que meus filhos [um casal na faixa dos 37/38 anos] têm de mim.”
Os rumos da educação no Brasil são uma de suas maiores preocupações. “Em 1964, quando eu fazia escola técnica de máquinas e motores, tinha um professor de história que dizia: ‘Agora vão investir na educação, e vamos colher os frutos disso daqui a 20 anos’. Pois bem, não investiram, e a situação ainda piorou. Veja em que condições estão os professores hoje em dia”, discursa.
Quem tem menos de 18 e mais de 70 anos de idade tem voto facultativo no Brasil; Crédito: Marri Nogueira / Agência Senado
Direito de reclamar depois
Ter o direito de “reclamar depois”. Essa é a principal motivação da aposentada Virgínia Nice Villaça da Veiga, de 87 anos, de São Paulo, para comparecer à seção de votação nestas eleições. “Se deixamos só para os outros o dever do voto, não podemos meter a boca depois em quem estiver no poder”, afirma.
Virgínia conta que continuou votando mesmo depois dos 70, mas que, neste ano, está com dificuldades para escolher seus candidatos. “Um é pior que o outro”, avalia. “Mas deixar de votar por estar de saco cheio de tudo não é justificativa. Eleição é igual a reunião de condomínio, quem não vai não pode reclamar depois das decisões que forem tomadas.”
O pensamento da socióloga aposentada Amarylis Nóbrega de Almeida Ferreira, de 79 anos, também de São Paulo, sobre o exercício do voto vai ao encontro da visão de Virgínia. “Ir às urnas me dá o direito de aplaudir ou criticar os que estiverem governando o país”, afirma. “Se não faço nada para mudar as coisas, como reclamar depois?”
Trata-se de uma missão que ela empreende há 61 anos, sem faltar nunca. “Voto desde os 18 anos, e isso tem um significado sentimental para mim. Quando me tornei eleitora, a mulher não era obrigada a votar, mas meu pai e minha mãe tinham um orgulho tremendo de mim e de minha irmã por já fazermos questão de exercer esse direito à época”, conta. “Se eu deixar de votar, meus pais vão se revirar no túmulo.”
Em sua opinião, “não existe voto certo ou errado, cada um vota segundo sua convicção”. No entanto, ela diz que, pela primeira vez na vida, chega a poucos dias das eleições “sem a chapa completa”. “Estou completamente atordoada. Em vez de apresentar planos de governo, os candidatos partem para ataques pessoais aos seus oponentes. Quando chegar o dia da eleição, vou escolher o ‘menos pior’, mas ainda assim digo que sempre vale a pena votar.”
Para quem tem dúvidas sobre os procedimentos na hora de votar, o TSE disponibiliza em seu site um simulador de votação na urna eletrônica; Crédito: Marri Nogueira / Agência Senado
Mais desinteresse
De acordo com pesquisa realizada pela empresa Hello Research, pessoas com idade igual ou superior a 60 anos estão entre os que demonstram menor interesse pelas eleições (36%), perdendo apenas para os sem posição ideológica (44%). Essa faixa etária corresponde a 18% do eleitorado brasileiro. O levantamento consultou 1.993 pessoas entre julho e agosto, com um índice de confiança de 95%.
Para quem tem qualquer dúvida sobre os procedimentos na hora de votar, o Tribunal Superior Eleitoral disponibiliza em seu site um simulador de votação na urna eletrônica.
Leia também
3,4 mi têm título de eleitor cancelado por decisão do STF
Direitos dos idosos: conheça verdades e mentiras