Imagine as seguintes cenas: uma bengala de madeira apoia um homem, enquanto ele caminha a passos curtos em direção ao bingo na praça – seu programa dominical preferido. Já, para a mulher, o balanço da cadeira é a única forma de mantê-la alerta à medida que tricota outro casaco para um de seus netos. Essas imagens são reais apenas na imaginação de quem não desconstruiu estereótipos das pessoas com mais de 60 anos de idade. Mas o fato é que elas ainda são presentes e estimuladas por conceitos ultrapassados.

Longevidade e ação marcam essa geração, que burla a figura estereotipada de “velho” carregado pelos pais e avós no século passado, de acordo com Ellen Woortmann, ex-vice-presidente da Associação Brasileira de Antropologia e membro do Núcleo de Estudos e Pesquisas da Terceira Idade da Universidade de Brasília (NEPTI/UnB). Se antes as mulheres envelheciam dentro de casa, hoje elas saem para trabalhar, exemplifica.

Clichê enraizado

Os estigmas têm relação, sobretudo, com as esferas de saúde e trabalho. Quem aqui já não se deparou com situações em que essa geração é retratada como inútil, ultrapassada ou incapaz de aprender novas habilidades?

Esses estereótipos estão relacionados a questões mercadológicas, avalia Eva Bettine, conselheira-executiva da Associação Brasileira de Gerontologia. “Nós passamos, por volta da década de 1960, de uma cultura de conservação para a de consumo e descarte. Precisávamos dizer que alguma coisa estava velha e que seria necessária substituí-la”, explica. “As pessoas ganham também esse rótulo: o velho precisa ser substituído por um novo”, pondera.

“A comunicação precisa aprender a valorizar a maturidade, mostrar o lado bom de envelhecer, a libertação, a segurança e o desprendimento”

Imagem limitada

Essa busca pelo novo a todo o custo teve um preço: resultou em uma imagem limitada nos meios de comunicação. Quem aí se reconhece na maior parte das peças publicitárias endereçadas a quem passou dos 60?

“O que se percebia antes mais fortemente na publicidade, mas que ainda existe, é a infantilização dessa geração ou o exagero de tratá-la como jovem radical”, avalia Tânia Zahar Miné, pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Práticas de Consumo (PHGCOM) e professora de trade marketing da ESPM-SP.

Ela vai além e afirma: “A participação do idoso na mídia era apresentada com deboche”. “A comunicação precisa aprender a valorizar a maturidade, mostrar o lado bom de envelhecer, a libertação, a segurança e o desprendimento que a vida vai nos dando, conforme ficamos mais velhos.”

TRÊS BOAS CAMPANHAS PUBLICITÁRIAS

Há, porém, peças que se destacam e mostram como campanhas podem ser bem-sucedidas ao focar com sensibilidade e humor temas relativos a quem tem mais de 60 anos de idade. Quatro delas estão abaixo, para você assistir.

“Não estamos preparados para lidar com a longevidade em todos os seus aspectos, especialmente no que diz respeito às manifestações da sexualidade”

Consequências e tabus

Reforçar os estereótipos contribui com a invisibilidade da individualidade. “Nem sempre os elementos que essa geração acredita serem importantes são levados em conta”, diz Ellen.

O resultado? Tabus e estigmas que ainda cercam a sexualidade nessa idade. A negação acarreta prejuízos como a perda de autonomia e de autoconfiança, segundo Paulo Tessarioli, especialista em sexualidade e presidente da Abrasex (Associação Brasileira dos Profissionais de Saúde, Educação e Terapia Sexual). “Com o passar do tempo, o surgimento da vulnerabilidade emocional, decorrente da falta de empoderamento pessoal, gera a dependência em todos os sentidos”, destaca.

“Ainda não estamos preparados para lidar com a longevidade em todos os seus aspectos”, ressalta Tessarioli. “É difícil assistirmos a propagandas de prevenção [de Aids] para idosos, porque ainda existe a ideia de que eles não têm vida sexual ativa”, exemplifica Miné.

“Envelhecer é viver”

Além da idade

A partir de qual idade começa o envelhecimento? Essa questão não pode ser respondida por meio de números. “Depende da vivência psíquica de cada um: tem gente que considera uma grande ameaça e existem pessoas que olham para o envelhecimento como um ciclo natural da vida”, assinala Ana Paula Magosso Cavaggioni, psicóloga, mestre em psicologia da educação da saúde.

Segundo a gerontologia, a concepção da vida é o início do envelhecimento, diferentemente do estigma de que o envelhecer começa a partir dos 60 anos. “Envelhecer é viver”, sentencia Eva Bettine.

DIVERSIDADE DÁ O TOM QUANDO O TEMA É 60+

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