Com mais de duas décadas dedicadas à saúde mental e ao envelhecimento ativo, a psicóloga especializada em neuropsicologia e gerontologia Cristiane Felipe tem uma carreira marcada por projetos inovadores, como a implantação de centros-dia para idosos e suporte em tratamentos oncológicos. Ela defende uma abordagem integrativa que valorize vínculos, propósito e plasticidade cerebral, e ressalta que o cérebro é capaz de criar novas conexões mesmo após os 60 anos.

Nesta entrevista em formato ping pong ao Portal do Instituto de Longevidade, Cristiane Felipe fala sobre os impactos emocionais do envelhecer, a diferença entre o ritmo do corpo e da mente, e como podemos manter o cérebro saudável e ativo por muito mais tempo.

Neuropsicóloga Cristiane Felipe fala de neuroplasticidade cerebral após os 60Imagem: Lightspring/shutterstock

Qual o maior desafio emocional do envelhecimento? E como lidar com ele?

Na minha prática clínica, percebo que as perdas são um grande desafio. Existem vários tipos durante o processo de envelhecimento: a perda de papéis sociais e identidade, que vem com a aposentadoria; a casa vazia; o luto por morte de amigos e familiares; e mudanças físicas. Tudo isso pode gerar a sensação de inutilidade, invisibilidade e inadequação.

Uma boa forma de enfrentar esses desafios é redefinir papéis sociais e cultivar bons vínculos de amizade e com a rede de apoio, o que é importante para evitar o isolamento. A psicoterapia individual ou grupos de apoio em centros de convivência ajudam a ressignificar essa nova fase de vida e melhorar a autoestima.

O que envelhece primeiro: o corpo ou a mente?

O processo de envelhecimento é individual e único, por isso é difícil precisar. Mas, tanto a literatura quanto a prática clínica indicam que o corpo envelhece primeiro. Iniciamos esse processo ainda na fase adulta, com o declínio da visão, alterações hormonais, perda de massa muscular e metabolismo. Nosso cérebro, apesar de sofrer alterações estruturais, mantém a plasticidade neuronal por muitos anos. 

Devemos cuidar do corpo com alimentação equilibrada, exercícios e sono de qualidade. E cuidar do cérebro com aprendizado contínuo, socialização, estímulos cognitivos, projetos, desafios e também com o cultivo das emoções, mantendo boa autoestima e resiliência.

Qual é o maior aliado da saúde cognitiva na maturidade?

Percebo — e vejo também nas publicações científicas — que os maiores aliados são a nossa reserva cognitiva e a neuroplasticidade. O cérebro continua capaz de criar novas conexões mesmo após os 60. Não sabemos com precisão o que fortalece a nossa saúde cognitiva, mas os estudos mostram que uma dieta rica em ômega-3, antioxidantes e vitaminas do complexo B, atividades como leitura, música, jogos de estratégia, cursos, exercícios físicos e meditação ajudam bastante. E gosto de acrescentar: a resiliência também é um grande aliado.

Cristiane Felipe, como cultivar propósito depois dos 60?

Propósito é o que dá sentido à vida e, por isso, devemos sempre mantê-lo vivo dentro de nós. Ele pode ser reinventado aos 60, 70, 80 anos, em qualquer momento da vida e dentro de cada realidade. Alguns caminhos possíveis para cultivá-lo são: ser voluntário; aprender algo novo ou ensinar; participar de projetos criativos ou espirituais; e integrar-se a grupos, clubes, universidades da terceira idade ou centros de convivência.

Quais os sinais de que é preciso cuidar mais da saúde cerebral?

  • Existem alguns sinais sutis que indicam que o cérebro precisa de atenção:
  • Esquecimentos frequentes ou confusão com datas e nomes
  • Mudanças de humor ou irritabilidade sem causa aparente
  • Apatia
  • Dificuldade em realizar tarefas cotidianas ou tomar decisões

Devemos estar sempre muito atentos aos sintomas de depressão, pois ela precisa ser devidamente tratada para preservar a saúde cognitiva.

Quais estímulos mentais ajudam a envelhecer com mais autonomia?

Estímulos mentais são como musculação para o cérebro. Eles mantêm a independência e a autonomia da pessoa. É muito interessante manter-se ativo durante o processo de envelhecimento e, se possível, engajado em algumas atividades. Alguns exemplos que podem ser utilizados são: jogos de lógica, memória e tabuleiro; leitura compartilhada e contação de histórias; atividades artísticas e manuais; oficinas de escrita, música ou jardinagem;  cursos de tecnologia ou idiomas

Como profissionais e instituições podem se preparar para o envelhecimento populacional?

O Brasil caminha para ser um país com mais idosos que crianças de maneira muito rápida, e ainda não estamos preparados. Isso exige uma verdadeira revolução nas políticas públicas, na formação profissional e na cultura institucional. 

Entre as preparações essenciais e urgentes, destaco a capacitação em gerontologia. Ou seja, profissionais da saúde, educação e assistência social precisam entender o envelhecimento como um processo biopsicossocial.

Além disso, criação de ambientes inclusivos que, tanto físicos quanto digitais, devem ser acessíveis e acolhedores. Políticas intergeracionais que promovam a convivência entre gerações para combater o etarismo também são fundamentais, assim como tecnologia assistiva e educação digital para garantir autonomia e inclusão.


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