No fim da década de 1980 e início dos anos 1990, Ingra Lyberato, hoje com 52 anos de idade, colheu precocemente os louros da fama. Aos 23 anos, estreava no horário nobre da Rede Globo na primeira fase da novela Tieta (1989). Meses depois, brilhou nos primeiros capítulos do folhetim arrasa-quarteirão Pantanal, na extinta Rede Manchete. O sucesso foi tanto que ganhou sua primeira protagonista na emissora já na trama seguinte: Ana Raio e Zé Trovão (1991).
Alçada ao posto de estrela e símbolo sexual, não lhe faltaram convites para atuar em diversas emissoras, peças teatrais e cinema. Ingra Lyberato, porém, se assustou com o êxito prematuro e, por diversas vezes, preferiu não assumir determinados compromissos, dando longas pausas entre um personagem e outro, principalmente na TV. "No início da carreira, fui levada a ver a fama como um lugar em que a pessoa precisa acertar sempre para ser aplaudida. Hoje a vejo como uma oportunidade de servir. Tinha medo de errar e assumir novas responsabilidades”, explica a baiana. “A idade resgatou minha espontaneidade”, completa.
O longo caminho para chegar a essa conclusão está exposto no livro “O Medo do Sucesso”, que ela lançou há dois anos. Em entrevista exclusiva ao portal do Instituto de Longevidade, a atriz que voltou ao horário nobre da Globo como a traficante Tereza da novela recém-terminada novela Segundo Sol (Globo), fala sobre como precisou tirar a máscara de mulher perfeita para escrever sua primeira obra, revela que após os 50 anos abandonou alguns temores, como o de ficar sozinha, e diz como manter a energia limpa pode rejuvenescer o espírito.
Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista.
Que diferenças nota entre as atuais mulheres acima de 50 anos e as da mesma idade, mas da geração da sua mãe?
A geração de minha mãe, Alba, queria liberdade, mas não arriscava. Porém, elas formaram as mulheres destemidas de hoje. Ela sempre combateu o machismo e defendia a liberdade de expressão, mas abandonou a profissão para criar filhos, nos preparando para deixar nossa essência aflorar. Por isso, eu e minha irmã Cândida, de 50 anos, parecemos duas garotas na forma de viver. Estou no auge da minha energia física e ela, além de produtora de cinema, é campeã de kitesurf.
A geração da minha mãe também começou a estudar alimentos saudáveis e estilo de vida. Graças a isso, a mulher de 50 anos hoje aparenta menos idade. Isso cria oportunidade para começar novas carreiras e relacionamentos.
Estamos quebrando padrões arcaicos. Antes, era um escândalo uma mulher casar com um homem vinte anos mais novo. Hoje é normal.
Você já disse que a vida ficou mais colorida aos 50. Por quê?
Porque estou perdendo meus medos e parei de me cobrar perfeição. Me sinto de férias de uma autoexigência sufocante. Não eram os outros que me pressionavam, era eu mesma! Hoje faço tudo com mais prazer, pois aceito que posso errar.
Curei também o medo de ser abandonada e a carência crônica. Não sinto mais pudores com nudez ou sexualidade. O amor, a paz e a alegria que buscamos fora, está dentro de nós. Somos mendigos pedindo esmolas, sentados em um baú repleto de ouro.
“Fui ao fundo do poço pela falta de alegria em viver”
Envelhecer já foi um problema?
Como tive filho com 37 anos, aos 40 estava me realizando como mãe em vez de ter crise. Nunca me senti em crise pela idade, mas pela falta de sentido na vida. Aos 47, meu filho tinha 10 anos e se tornava autossuficiente. Eu estava me separando do segundo marido. Fui ao fundo do poço pela falta de alegria em viver. Dizem que lá tem molas (risos).
Acordei! Vi que precisava de autoconhecimento, cura, evolução. Então, mergulhei no autoestudo: leituras, conversas com amigas terapeutas e auto-observação. Meu mundo interior ganhou novas dimensões, descobri dons.
Com 50 anos, escrevi meu primeiro livro, “O Medo do Sucesso”, baseado no autoconhecimento. Só a mudança de crenças e paradigmas muda uma realidade. Isso exige esforço, determinação e amor próprio.
Hoje, como encara a fama?
No início da carreira, fui levada a ver a fama como um lugar em que a pessoa precisa acertar sempre para ser aplaudida. Hoje, a vejo como uma oportunidade de servir. Isso transformou minha relação com o sucesso.
Nunca me senti melhor que os outros, mas tinha medo de errar e assumir novas responsabilidades. Dar as costas para um caminho que se abre é arrogância. A verdadeira humildade é sair da zona de conforto e expandir potencialidades para, aí sim, ajudar os outros com o exemplo de que tudo é possível. Resistir ao crescimento atrapalha o processo coletivo.
Qual a principal diferença entre atuar nos anos 1990 e hoje?
Agora me sinto parecida ao que era no começo, quando tinha prazer no risco da liberdade de expressão. Fui tão aplaudida no início que adquiri medo de errar e estou me curando. O medo ou o desamor são criações da mente. Nossa essência é de amor, espontaneidade e possibilidades ilimitadas. Com as quedas do caminho, ficamos traumatizados. Mas toda dor é passageira se a gente entende o recado que ela traz.
“Não imaginava que estaria tão em forma aos 52”
Mulheres como você, consideradas símbolos sexuais, são mais pressionadas a se manterem eternamente belas. Como essa cobrança bate à sua porta?
A sensualidade faz parte da expressão do meu ser. É uma das minhas forças e aprendi a aproveitar essa energia. Mas não imaginava que estaria tão em forma aos 52.
Sempre gostei de me movimentar, mas não sou obcecada por academia. A energia precisa circular. Emoções jogadas debaixo do tapete e lágrimas não derramadas também criam doenças. Além desse corpo denso, temos os corpos energéticos.
Ninguém ensina essas coisas na escola e aí as pessoas ficam velhas, gordas e sem saúde porque não sabem que tudo é energia. A saúde está na alegria de viver e a maioria dos médicos estudam doenças e não saúde. Tenho uma aparência jovem porque não acredito em velhice nem em doença. Cuido e amo meu corpo. Limpo sua energia todos os dias e só permito aproximação de quem vibra na mesma frequência.
O que a idade lhe trouxe de melhor?
Coragem para enxergar minhas faces menos belas e aceitá-las para transformá-las, vontade de compreender mais a natureza humana e expandir minha consciência, capacidade de amar e aceitar o outro incondicionalmente, paciência para esperar as coisas acontecerem enquanto faço minha parte, conhecimento de que tudo o que quero está dentro de mim, consciência de que não existem limites de realização na vida e humildade para aceitar as circunstâncias com firmeza.
“A idade resgatou minha espontaneidade”
Além disso, a idade resgatou minha espontaneidade, ou seja, a vida tá começando a ser divertida para enfrentar desafios ou celebrar conquistas. Também trouxe calma para usufruir a vida.
Em 2018, você posou nua para o projeto Pele Project. Como se sentir segura e tirar a roupa para um ensaio aos 52 anos, considerando possíveis julgamentos?
O projeto era para as pessoas tirarem as máscaras. Se expor publicamente, exige coragem e estou aprendendo a amar desafios.
Hoje, não tenho pudor com meu corpo e esconder a nudez não faz sentido. É como esconder a verdade. Meu corpo sou eu, faz parte do meu ser. Como posso ter vergonha?
No projeto não existe maquiagem ou preparação. O objetivo era a expressão da natureza de cada corpo, e o fotógrafo enxergou que sou mariposa, borboleta, lagarta…
Por que as mulheres se submetem cada vez mais cedo a tratamentos estéticos?
Entendo a pessoa não querer ver as rugas que aparecem, mas a gente se acostuma. Em uma época, apareceram "pés-de-galinha", e eu não tinha dinheiro para botox. Foquei outras coisas e, quando dei conta, nem reparava mais nisso.
“O corpo muda e precisamos de tempo para aceitar”
O corpo muda e precisamos de tempo para aceitar. Hoje tenho coisas mais valiosas para serem admiradas. Se alguém quer preencher cada marquinha, vá em frente. Só cuida para não colocar sua realização nisso.
O conceito do que é belo mudou com o tempo para você?
Continuo apreciando a beleza com atitude genuína, mas hoje sei porque sempre admirei mais o que está invisível. De alguma forma, intuía que a energia alimenta tudo. Se alguém se aproxima com brilho nos olhos, não estou nem aí para os músculos.
Sempre gostei da espontaneidade, pois reflete a verdade de cada um. O que a pessoa faz com sua própria existência e nas pequenas coisas do dia a dia é o que desperta admiração e paixão. A generosidade, a tranquilidade, a sabedoria, a alegria são características que deixam qualquer um bonito.
O que a Ingra de hoje poderia ter da Ingra de 20 anos atrás? E o que a Ingra de 20 anos atrás deveria ter da Ingra de hoje?
A Ingra de hoje poderia ter o tempo que a juventude tem pela frente. Se a Ingra de 20 anos atrás tivesse a minha consciência de hoje, eu teria me potencializado mais por meio do amor. Mas isso vem com o tempo e, se me sabotei por medo, hoje posso dizer que experimentei quase tudo na vida.
Já andei na lama e em caminhos de flores, já criei dor e felicidade para mim e para os outros. Como eu teria consciência sem ter experimentado esses mundos internos? A vivência atenta é uma benção.
“Gastei muita energia carregando a máscara de perfeita, bem-sucedida”
De todas as mentiras que já contou para si, qual foi a maior?
Escrevi um livro para escancarar minhas mentiras. Assim, não poderia mais sustentá-las. Gastei muita energia carregando a máscara de perfeita, bem-sucedida, irresistível, esposa ideal… Tudo mentira!
Já falhei várias vezes, recebi "não" outras tantas, me debati com ciúme e inveja, cometi erros que ainda trabalho para reparar, fiz pessoas sofrerem e também sofri. O caminho é encarar sua face mais horrível, aquela que não quer ver, aceitar e se amar assim mesmo. Assim, aprendemos a aceitar o outro com suas deficiências, pois aceitamos a nossa. A cura é o amor, sempre.
Quais seus próximos projetos?
Vou iniciar as filmagens do documentário "A Vida É da Cor que Pintamos", sobre vida e obra do meu pai, o artista plástico e cineasta Chico Liberato. No início de 2019, retomarei as filmagens da série As Amazonas, sobre mulheres da América Latina que vivem o universo dos cavalos.
Estou finalizando meu segundo livro, uma ficção sobre o despertar da consciência. Também tenho roteiros em andamento, quero gravar um disco e estrear o monólogo baseado no livro “O Medo do Sucesso”.
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