O Brasil está envelhecendo rapidamente. Segundo o último Censo Demográfico, realizado em 2022, a população com mais de 60 anos já representa 15,8% dos brasileiros. Estima-se que, em 2060, os idosos superarão o número de crianças no país, o que traz uma série de desafios para a sociedade, especialmente no que diz respeito à saúde e ao acesso a um plano de saúde, cuja contratação já enfrenta uma série de entraves.

A legislação vigente determina que a idade não pode ser um impedimento para a contratação de planos individuais, sob risco de multas para as operadoras. Porém, na prática, os valores desses planos se tornam proibitivos após os 59 anos, além das restrições para portabilidade e carência, tornando a oferta quase inexistente para os idosos.

Além disso, a lei estabelece que, a partir dos 60 anos, o reajuste dos planos de saúde individuais não pode ultrapassar seis vezes o valor da faixa inicial, o que limita o aumento do preço para faixas etárias superiores. Essa regra, apesar de proteger o consumidor, tem efeito colateral. Muitas operadoras simplesmente deixam de comercializar planos individuais para essa faixa etária, empurrando os idosos para alternativas mais complexas.

Idosa contratando plano de saúde PJFonte: fizkes/shutterstock

Plano de saúde empresarial se torna alternativa

Entre as possibilidades para contratar um plano de saúde após os 60 estão os coletivos ou por adesão. Normalmente a contratação é feita através de um vínculo com entidade representativa profissional, algo que nem sempre o idoso possui. Além disso, o preço da mensalidade costuma ser mais baixo no começo, mas os reajustes tendem a ser maiores.

Outra opção são os planos empresariais, os chamados PJ, que exigem vínculo com uma empresa. Para conseguir a contratação nesses moldes, muitos idosos abrem um CNPJ que ficará inativo e será usado apenas para essa finalidade. Essas empresas não possuem faturamento ou atividade econômica real, sendo uma ferramenta formal para que o idoso consiga acesso à saúde suplementar.

Entretanto, o uso dessa estratégia tem gerado um problema grave: a dificuldade para deduzir esses gastos no imposto de renda. Isso porque a Receita Federal exige comprovações documentais rigorosas, muitas vezes impossíveis para o cotidiano dos idosos, que podem fazer pagamentos em dinheiro, utilizar contas conjuntas ou ter limitações no acesso a ferramentas digitais para obter comprovantes detalhados.

Essa exigência excessiva tem resultado em inúmeras autuações, como inclusão na malha fina e multas para os idosos, configurando o que especialistas classificam como uma “violência patrimonial” institucionalizada. Ou seja, um constrangimento fiscal que agrava ainda mais a vulnerabilidade dessa população.

PL busca simplificar dedução de despesas com plano de saúde PJ

Em resposta a essa situação, alunos da Faculdade de Direito da Fundação Getulio Vargas (FGV) apresentaram um Projeto de Lei que visa simplificar a dedução das despesas com um plano de saúde empresarial contratado por meio de empresas inativas. O projeto reconhece a legitimidade dessas empresas como instrumento lícito de acesso à saúde suplementar e propõe formas alternativas de comprovação das despesas, com presunção de boa-fé do contribuinte idoso.

O texto, apresentado ao deputado Pedro Aihara neste mês de maio, já conta com o apoio do Instituto de Longevidade MAG e outras entidades, que reconhecem a importância de avançar na proteção dos direitos dos idosos e na simplificação das obrigações fiscais a que estão submetidos. "Esse projeto é sobre um problema real: a Receita Federal tem autuado muitos idosos por causa de planos de saúde empresariais contratados por empresas inativas. É uma situação injusta que causa muita dor de cabeça e sofrimento para quem já deveria estar tranquilo", ressalta Aihara.

Segundo o deputado, o objetivo do PL é reconhecer a  simplificar a vida dos idosos e reconhecer sua boa fé. "Não é privilégio, é justiça! Nossa Constituição e o Estatuto do Idoso garantem a proteção a essa parcela da população. Com essa lei, vamos acabar com essa burocracia desnecessária e garantir que o direito à saúde seja respeitado, sem perseguição fiscal", avalia.

Um problema de acesso e dignidade

De acordo com Roberto Pio Borges, supervisor do Field Project da FGV, responsável pela criação do PL, a exigência da Receita Federal para comprovação exata do pagamento nas contas bancárias do idoso é, muitas vezes, impraticável. “Isso gera um processo desgastante, que pode ser considerado uma violência patrimonial institucional contra pessoas já fragilizadas pelo tempo”.

Roberto explica que o envelhecimento populacional é uma realidade que impõe desafios crescentes ao sistema de saúde brasileiro; e que, no caso da aquisição de um plano de saúde, a maior parte dos idosos depende de planos coletivos empresariais, cuja contratação exige vínculo com uma empresa, que frequentemente é aberta apenas para esse fim e permanece inativa.

“Os próprios idosos arcam com os custos, usando suas aposentadorias e pensões, mas enfrentam dificuldades para comprovar essa condição para fins fiscais. Além dos impactos financeiros, o constrangimento emocional e o desgaste provocado por processos burocráticos complexos comprometem a qualidade de vida dos idosos, que precisam de atenção especial e medidas que facilitem o acesso à saúde, sem penalizações indevidas”, afirma.

Direito à saúde e proteção legal

A proposta do Projeto de Lei está amparada por princípios constitucionais e legais que asseguram a dignidade da pessoa humana, o direito à saúde e a proteção especial à população idosa. Além disso, o Código Tributário Nacional e o Código Civil garantem interpretação favorável ao contribuinte em caso de dúvidas, bem como a presunção de boa-fé nas relações jurídicas.

O Estatuto do Idoso, por sua vez, reforça a necessidade de políticas públicas e normativas que protejam a autonomia financeira e o bem-estar desse grupo. O objetivo é evitar que burocracias e exigências desproporcionais se transformem em barreiras para o acesso a serviços essenciais.

“Com o PL, busca-se não apenas garantir segurança jurídica para os idosos, mas também reduzir o contencioso tributário e os danos psicológicos causados por autuações indevidas, promovendo uma legislação mais humana e adequada à realidade dessa população”, reforça Roberto.

Um chamado à sociedade e aos parlamentares

A medida proposta pelos alunos da FGV e apoiada pelo Instituto de Longevidade MAG é um importante passo para enfrentar um problema silencioso, que afeta milhões de brasileiros na terceira idade. O envelhecimento da população demanda respostas sensíveis e eficazes para garantir a saúde, a dignidade e o respeito aos idosos.

Neste Junho Violeta, mês dedicado à conscientização sobre a violência contra a pessoa idosa, é fundamental ampliar o debate sobre a violência patrimonial institucional e mobilizar apoio para a tramitação desse Projeto de Lei no Congresso Nacional.

Garantir o direito à dedução fiscal das despesas com planos de saúde empresariais contratados por empresas inativas representa um avanço na proteção social e um gesto de justiça para com aqueles que mais precisam.


Você quer saber quais os tipos de violência que podem ser praticadas contra o idoso e como combatê-las? Acesse nossa cartilha gratuita sobre o tema. É só baixar! 

Como evitar e combater a violência contra a pessoa idosa

Preparamos uma cartilha para ajudar você a entender quais são os tipos de abuso cometidos contra pessoas idosas, saber como identificar os sinais e como denunciar nos canais corretos.

Livro

Leia também:

Cartilha de violência patrimonial contra pessoa idosa ganha atualização com foco em apostas online

Violência financeira contra a pessoa idosa: um grave problema

Idosos com planos de saúde crescem em número e exigem mais cuidado

Compartilhe com seus amigos

Receba os conteúdos do Instituto de Longevidade em seu e-mail. Inscreva-se: