Um dos mais experientes repórteres investigativos do país, Saulo Gomes ficou conhecido por quebrar o silêncio de 24 anos de Chico Xavier (1910-2002) depois de uma reportagem – “Chico, detetive do além”, para a revista “O Cruzeiro”, em 1944 –, que questionava sua mediunidade. Desse primeiro contato nasceu uma parceria de 34 anos e o carinhoso título de “repórter do Chico”.
Aos 90 anos, o jornalista lança seu terceiro livro sobre o líder espiritual: “Nosso Chico”. “É a nossa história”, resume. A de uma relação que começou há exatos 50 anos, entre um repórter de 40 anos, ávido por um furo jornalístico, que aconteceu (em 1968, na TV Tupi, pela primeira vez, câmeras exibiram uma sessão espírita e uma psicografia), e um médium que veio a se tornar o mais conhecido representante espírita após o próprio codificador da doutrina, Allan Kardec (1804-1869).
Na obra, Saulo Gomes conta que, anos depois, enxergou algo muito maior nessa oportunidade: “Aprendi muito como ser humano”. A humildade foi um dos legados, afirma, em entrevista ao portal do Instituto de Longevidade. Chico Xavier era “paz e bondade”, descreve. “Qualquer pessoa que chegasse perto dele triste, preocupada ou com outro sentimento negativo saía de espírito mais leve.”
Confira, a seguir, a íntegra de sua entrevista:
Em “Nosso Chico”, Saulo Gomes conta como conseguiu convencer Chico Xavier a dar uma entrevista depois de 24 anos em silêncio; crédito: Divulgação
Na sua primeira entrevista com Chico Xavier, para a TV Tupi, em maio de 1968, o médium estava diante de um católico, um evangélico, um espírita? Com o passar dos anos, algo mudou na sua religiosidade?
O médium estava diante de um jornalista/repórter investigativo, como sempre acontecia, esperando um furo jornalístico. E o furo aconteceu! Quanto à religiosidade, mudou.
O que mudou?
Meu contato com Chico me levou a crer em outras vidas. E o convencimento veio depois que Chico recebeu a mensagem de Emmanuel, endereçada a mim [a íntegra, que o incentivava a continuar a reportagem-campanha em prol do Hospital do Fogo Selvagem, está nas págs. 127 a 134 do livro “Nosso Chico” – “...eu vos digo, meu irmão, vossa missão é sublime, não desanimeis, não espereis reconhecimento...”].
Na minha convivência com Chico, durante mais de 30 anos, presenciei fatos inéditos. Atualmente, estudos científicos já encontraram a prova de que existe vida depois da morte.
Você sentiu o peso da responsabilidade de quebrar o silêncio de 24 anos dele com a imprensa, após o caso com “O Cruzeiro”?
Senti. Chico não merecia uma segunda decepção com um repórter. Eu o entrevistei com o maior respeito, e essa minha entrevista abriu caminho para a grande imprensa.
O primeiro encontro de Saulo Gomes e Chico Xavier, em Uberaba (MG), em 1968; crédito: Divulgação
E depois, com o médium Zé Arigó, condenado à prisão por falsidade ideológica e exercício ilegal da medicina?
Graças ao apoio de Chico, consegui a entrevista com Zé Arigó, que, quatro anos depois de sair da cadeia, não dava entrevista a nenhum órgão de imprensa. Foi mais um furo jornalístico para minha emissora, a TV Tupi.
“A vontade de realizar um bom trabalho superava o medo”
Que impressões você guarda da primeira vez que você assistiu – e filmou – uma sessão espírita e uma psicografia?
Surpresa! E satisfação de uma grande conquista profissional, para mim e para o jornalismo brasileiro. Foi uma boa oportunidade de mostrar um jornalismo levado a sério e em especial para o grande público, que reagiu de forma extraordinária pelo inusitado do fato.
E de uma cirurgia espiritual?
Impacto! Para mim e depois para o público. Documentei cirurgias complexas, com o uso de instrumentos inadequados, caseiros, sem anestesia. O surpreendente foi o paciente não demonstrar dor e não haver hemorragia no local operado.
Você sentiu medo alguma vez?
Não. A vontade de realizar um bom trabalho superava o medo.
Você, pessoalmente, recebeu alguma comunicação de espíritos de familiares seus, via Chico Xavier?
De familiares para mim, nunca. Não tive esse merecimento. Recebi, através de Chico Xavier, uma psicografia de Emmanuel quando estava em dificuldade com a campanha para o Hospital do Fogo Selvagem, de Uberaba [MG]. Conto esse fato em detalhes no livro “Nosso Chico”.
Em “Nosso Chico”, Saulo Gomes conta a reação de Chico Xavier à polêmica reportagem sobre ele na revista “O Cruzeiro”, em 1944; crédito: Divulgação
“Nosso Chico” é seu terceiro livro. A experiência de 90 anos de vida faz diferença em uma obra?
O primeiro livro, “Pinga-Fogo”, é um livro jornalístico, traduz o programa [da TV Tupi – veja abaixo] literalmente; o segundo, “As Mães de Chico Xavier”, é uma obra de consolo e esclarecimento para quem vive a experiência da perda de um ente querido. E “Nosso Chico” narra a convivência entre o repórter e o médium durante mais de 30 anos. É a nossa história. É evidente que a experiência de 90 anos de vida faz diferença.
Por que faz diferença?
Experiência de 90 anos faz a diferença em qualquer situação, principalmente pelo amadurecimento e pela responsabilidade que adquirimos através do tempo.
Como surgiu o apelido de “repórter do Chico”?
É um título que aceito com muito carinho até hoje. Chico sugeria que eu o acompanhasse em entrevistas e participações em programas, e os colegas de imprensa começaram a me nomear como “repórter de Chico”. Escrevi três livros sobre Chico, faço palestras sobre Chico e fui o embaixador de Chico em “O maior brasileiro de todos os tempos”, programa da BBC de Londres/SBT. Enfim, divulgo as obras e a vida de Chico, que, sem dúvida, foi o maior médium que conheci. Faço isso desde que conheci Chico, em 1968.
Você sabe por que foi escolhido para essa missão?
Acredito que, durante a primeira entrevista, quando Chico pegou em minha mão e me disse “Você é quem eu pensava”, entendo que ele quis dizer que sabia que viria alguém que o ajudaria na divulgação do espiritismo.
Nesses 34 anos de convívio, qual foi o momento mais marcante dessa parceria?
Sem dúvida, o primeiro encontro com Chico Xavier.
Como gostaria que Saulo e Chico fossem lembrados?
Como dignos representantes: eu, do jornalismo, e Chico Xavier, do espiritismo.
O que Saulo aprendeu com Chico?
A humildade.
FICHA TÉCNICA
Título: “Nosso Chico”
Editora: InterVidas
Gênero: Biográfico
Páginas: 296
Preço: R$ 45 (em promoção por R$ 36 no site da editora)
Leia também
O poder da oração: saiba o que ela pode fazer por você
Medicina x espiritualidade: oncologista explica como as duas coisas devem andar juntas