Buzinas, motores, ruídos de aviões e helicópteros, obras, música alta... Especialmente quem vive em uma cidade como São Paulo sabe que é difícil encontrar lugares onde o silêncio predomina a maior parte do tempo. Exceto em determinados refúgios, dentro das grandes metrópoles o barulho excessivo e constante faz parte do dia a dia da população.

E muito além de ser desagradável, é preocupante para a saúde: não só pode comprometer o sistema auditivo como afetar o bom funcionamento do organismo. Um número cada vez maior de pesquisas tem apontado uma relação direta entre a poluição sonora e o aumento no risco de problemas cardiovasculares. Os levantamentos revelam que os efeitos são comparáveis ao do fumo passivo.

Grande estresse fisiológico 

O relatório "Fronteiras 2022: Barulho, Chamas e Descompasso", elaborado por pesquisadores do Programa da ONU para o Meio Ambiente (PNUMA), alerta para os impactos, em longo prazo, da poluição sonora para a saúde física e mental. Os estudiosos apontam que pessoas submetidas a ruídos constantes podem desenvolver diversas doenças que interferem no funcionamento do coração, como a hipertensão arterial, diabetes, distúrbios cardiovasculares e cerebrovasculares.

A exposição ao ruído alto e excessivo rotineiramente provoca o surgimento ou agravamento de um quadro de estresse crônico. O barulho impulsiona mecanismos cerebrais responsáveis pelas emoções, o que acarreta no aumento da produção de hormônios ligados ao estresse e a ansiedade, como cortisol e adrenalina.

Essas substâncias estimulam o coração a bombear sangue de forma mais rápida, exigindo mais do órgão. Outras mudanças significativas são: artérias que se contraem ou dilatam demais; pressão arterial elevada; digestão mais lenta; fluxo de sangue para os órgãos internos reduzido; o corpo mobiliza energia e libera mais açúcares e gorduras na corrente sanguínea para uso rápido dos músculos. O organismo ativa desta forma um estado de vigilância e alerta, uma reação de "fuga ou luta" - mesmo que o indivíduo não tenha consciência disso, por exemplo, durante o sono.

Consequências

Com o tempo, a exposição recorrente a muito barulho provoca o aumento da tensão nos vasos sanguíneos e no próprio coração. Há também mudanças importantes no endotélio, o revestimento interno dos vasos. A liberação excessiva de hormônios gera um desequilíbrio no organismo e um consequente processo inflamatório no endotélio.

Os resultados são o enrijecimento da parede dos vasos e o acúmulo de placas de gordura no local. O risco de hipertensão passa a ser maior assim como do diabetes - em decorrência da elevação do nível de glicose. Aumentam as chances do desenvolvimento de doenças e complicações cardiovasculares, como a insuficiência cardíaca, doença arterial coronariana, infarto e acidente vascular cerebral (AVC).

Quem está mais vulnerável?

Alguns grupos são tidos como mais vulneráveis e sensíveis a distúrbios causados por esse tipo de problema, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Entre eles estão os trabalhadores noturnos, doentes crônicos, idosos e populações mais pobres, que em sua maioria não podem escolher morar em bairros calmos ou ter residências com o isolamento adequado.

Para aqueles que já apresentam fatores de risco para doenças cardiovasculares, viver em um ambiente ruidoso pode acelerar problemas, como a aterosclerose (formação de placas de gordura na parede das artérias do coração).
Um mulher, com um travesseuro nos ouvidos, como se o barulho estivesse incomodando. Ela está de pijama. Crédito: Anatoliy Karlyuk/shutterstock

Na hora de dormir precisamos de silêncio!

Se não bastassem os barulhos diurnos, há quem não consiga dormir bem pelo excesso de ruídos durante a noite. No entanto, o sono é um regulador de diversas funções do organismo - por exemplo, moderador da liberação de hormônios, de açúcares e de funções cardiovasculares. Podemos dizer que o sono é reparador. Quando dormimos nossos batimentos cardíacos são reduzidos, assim como a pressão arterial, estado que permite ao organismo compensar energia.

Por outro lado, sua interrupção constante pode ser muito prejudicial. Noites mal dormidas afetam o sistema imunológico, influenciam no apetite e gasto de energia, geram cansaço, estresse e irritabilidade, estimulando a liberação de cortisol. Se o cenário de sono fragmentado é frequente, a tendência é ocorrer um aumento na pressão e o desenvolvimento da disfunção vascular (disfunção endotelial), amplificando o trabalho do coração e a possibilidade do aparecimento da doença coronária e outras complicações cardiovasculares – como já explicado acima.

Estudos recentes mostram que o ruído noturno tem sido associado a um aumento da pressão mesmo quando as pessoas não acordam ou percebem que o sono foi interrompido. Apesar dos olhos fechados, os ouvidos seguem atentos, levando o corpo a reagir.

Limites

E o volume do som não precisa ser tão alto. O fato de a pessoa estar cronicamente exposta ao barulho é que acaba se tornando um grande problema. No entanto, níveis de ruído prejudiciais à saúde são geralmente definidos como aqueles a partir de 70 a 80 decibéis. Para efeito de comparação, uma conversa alcança normalmente cerca de 60 dB; o barulho de carro e caminhões gira em torno de 70 a 90 dB; enquanto o ruído de sirenes e aviões podem atingir 120 dB ou mais.

O que fazer em uma cidade grande ou perto de áreas de tráfego intenso?

Esses dados servem como um alerta. Vimos aqui que a poluição sonora é um problema mais grave do que muitos imaginavam. Afeta a qualidade de vida de milhões de pessoas e é mais um potencial agressor à saúde do coração – se unindo a outros fatores de risco mais conhecidos e amplamente divulgados. O barulho ainda prejudica o desempenho cognitivo, a atenção, o raciocínio e a memória.

Por isso, é importante buscar medidas preventivas, especialmente quando a exposição é intermitente ou excessiva. Algumas soluções individuais podem ajudar, como a adoção de protetores auditivos; redução do tempo de uso de fones de ouvido; evitar lugares com muito barulho; instalar, quando possível, janelas ou cortinas que reduzam o ruído e até mudar o quarto para uma parte mais silenciosa da casa.

Outra ideia que pode ajudar a não só nos distanciar da poluição sonora, mas também contribuir na redução do estresse, é buscar locais e reservar mais momentos na natureza. Os sons desse tipo de ambiente têm impactos positivos: o canto de pássaros, sons de folhas e árvores, além daqueles produzidos por outros animais, são capazes de reduzir a ansiedade e promover um descanso mental.

Essas medidas são importantes mesmo que a pessoa não se sinta especialmente incomodada pelo barulho. Como vimos, muitas vezes nos acostumamos com o som, mas nosso inconsciente não. Estar habituado aos ruídos não necessariamente significa que não corremos o risco das consequências negativas por eles geradas à saúde.


Leia também:

Teleconsulta: o que é, como funciona e quais os benefícios para você?

Estímulos criativos e a sua importância na vida e na socialização dos 50+

Conservação de alimentos pode ajudar na hora de economizar: especialistas mostram como fazer

Compartilhe com seus amigos

Receba os conteúdos do Instituto de Longevidade em seu e-mail. Inscreva-se: