Estudo brasileiro mostra como o peso afeta o cérebro desde a infância até a meia-idade. Pesquisadores da Universidade de São Paulo identificaram que o ganho de peso contínuo pode acelerar o declínio cognitivo. Os resultados sugerem que mudanças corporais precoces têm impacto direto na saúde cerebral de longo prazo.

A pesquisa foi publicada no periódico científico Neurology e faz parte da tese de doutorado do geriatra Paulo Henrique Lazzaris Coelho. O trabalho utilizou dados de mais de 11 mil pessoas do Estudo Longitudinal Brasileiro de Saúde do Adulto (ELSA-Brasil). O objetivo era avaliar as possíveis conexões entre trajetórias de peso corporal e desempenho cognitivo.

Crescimento contínuo de peso pode acelerar declínio

Os participantes do estudo relataram sua percepção corporal em cinco momentos da vida. Essa percepção foi aos 5, 10, 20, 30 e aos 40 anos. A equipe de pesquisa categorizou os perfis em quatro trajetórias: peso normal estável, normal para sobrepeso, abaixo do peso para normal e sobrepeso estável.

Entre os grupos analisados, aqueles que apresentaram aumento de peso ao longo da vida tiveram pior desempenho cognitivo. Segundo o estudo, indivíduos que passaram de peso normal para sobrepeso apresentaram envelhecimento cerebral antecipado de até 4,6 anos. Já os que permaneceram com sobrepeso registraram um envelhecimento de 6,5 anos.

Esses efeitos foram observados ao longo de três fases de avaliação. Os testes cognitivos incluíram tarefas de memória, linguagem e função executiva. “A maioria dos estudos olha para o indivíduo uma vez só, fazendo uma fotografia do desempenho cognitivo daquele momento. No nosso estudo, como avaliamos três momentos, conseguimos criar um filme sobre a cognição daquela pessoa”, explicou Coelho à Agência Einstein.

Como o peso afeta o cérebro em diferentes funções cognitivas?

A equipe aplicou testes de memória para avaliar a capacidade de recordar palavras após diferentes intervalos de tempo. O segundo teste, de fluência verbal, exigiu que os participantes citassem palavras de categorias como “animais” e “vegetais”. Também foram avaliadas palavras com as letras A e F. O terceiro teste, de trilhas, media a função executiva a partir da velocidade de associação entre números e letras.

Os pesquisadores observaram que o desempenho nesses testes foi pior entre os indivíduos com trajetória de ganho de peso. As funções mais afetadas foram a memória e a capacidade de planejamento. “Quanto menos tempo ele demora, melhor”, explicou Coelho, ao comentar o teste das trilhas.

Entre os fatores que explicam como o peso afeta o cérebro, estão a inflamação crônica e alterações hormonais associadas à obesidade. Além disso, doenças cardiovasculares, comuns em pessoas com sobrepeso, podem comprometer o fluxo sanguíneo cerebral. O acúmulo de proteínas como a beta-amiloide, relacionada ao Alzheimer, também pode ter papel no declínio cognitivo.

Nutricionista medindo a cintura da mulher com sobrepeso com fita métrica. Imagem para ilustrar a matéria sobre como o peso afeta o cérebro. Crédito: Jordi Mora/Shutterstock

Impactos maiores em grupos vulneráveis

Ao entender como o peso afeta o cérebro, o estudo mostrou ainda que os efeitos do ganho de peso foram mais acentuados entre mulheres e pessoas negras ou pardas. Já entre homens brancos, não houve associação significativa. Para os pesquisadores, as causas podem incluir tanto fatores biológicos quanto determinantes sociais.

Mulheres negras e pardas enfrentam mais dificuldades para acessar cuidados de saúde de qualidade. Além disso, lidam com obstáculos que impactam diretamente no controle do peso, como menor acesso a alimentação equilibrada e prática regular de exercícios. “Isso pode contribuir para o ganho de peso e, consequentemente, para um maior risco de comprometimento cognitivo”, afirmou o neurologista Marco Túlio Pedatella, do Hospital Israelita Albert Einstein em Goiânia.

Outro ponto relevante é o estresse crônico gerado por situações de desigualdade social e racismo. Segundo Pedatella, esse tipo de estresse também pode prejudicar a saúde mental e acelerar o declínio cognitivo. “O acesso limitado a serviços de saúde pode levar a diagnósticos tardios e à falta de intervenções preventivas”, observou.

Prevenção pode reduzir impactos sobre o cérebro

A pesquisa destaca que o controle do peso é um fator importante na prevenção do declínio cognitivo. Participantes que mantiveram o peso normal ao longo da vida apresentaram melhor desempenho nos testes cognitivos. Após os 35 anos, o declínio da função cerebral é esperado, mas pode ser acelerado com o surgimento de doenças crônicas.

Os pesquisadores recomendam políticas públicas que incentivem o controle de peso desde a infância. Também sugerem que profissionais de saúde passem a considerar a avaliação cognitiva em pessoas com histórico de obesidade. “Estudos como esse, com dados específicos da população brasileira, são fundamentais para adaptar diretrizes de saúde ao nosso contexto”, concluiu Pedatella.


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