Uma bem-sucedida executiva que, diante das inquietações de sua alma, abre mão das posições conquistadas “à custa de muito esforço e abnegação” e embarca numa jornada de autoconhecimento em busca de seu propósito de vida. A mudança de carreira na meia-idade faz parte do enredo do recém-lançado "O Caminho de Shanti", que conta a própria história de Shirley Brandão, 48 anos, especialista em liderança e gestão organizacional.
“Ao percorrer as páginas do livro, em vez de respostas, recebemos um impulso mágico que nos põe na direção de nosso verdadeiro encontro com a verdade”, prefacia o escritor Cesar Romão. “Impossível de ler em conta-gotas”, resume a atriz e escritora Norma Blum. A seguir, os principais trechos de sua entrevista ao portal do Instituto de Longevidade.
Entrevista com Shirley Brandão sobre mudança de carreira
Qual a história do "O Caminho de Shanti"?
O livro fala sobre a jornada de Shanti, uma executiva muito bem-sucedida que, diante das inquietações de sua alma, abre mão das posições conquistadas à custa de muito esforço e abnegação e, mesmo após os 40 anos, busca um recomeço de carreira mais alinhado a seus propósitos.
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Uma viagem para o charmoso vilarejo medieval de Eze, no sul da França, foi o ambiente escolhido pela protagonista para compartilhar com uma amiga toda a saga percorrida em busca de descoberta da sua verdadeira chama de vida. O que Shanti não sabia é que descobrir seu propósito exigiria que ela entrasse em contato com feridas até então desconhecidas e inimagináveis, desapegar-se de suas verdades, em um processo que misturava dor, amor e perdão.
É um livro, então, sobre propósito de vida?
Exatamente. As inquietações no coração de Shanti eram, justamente, o seu propósito, trazendo lampejos de que a vida poderia significar muito do que ela havia idealizado, a partir das verdades que contou para si ao longo de sua existência. Para realinhar-se ao seu propósito, ela precisou perdoar seu passado, refutar suas próprias verdades e honrar sua história.
O livro é baseado em histórias reais?
Na minha história! Alguns fatos, a maioria, são reais; outros, surreais. Mas o que me motivou a escrever e publicar foi perceber, através da própria experiência de 31 anos trabalhando com desenvolvimento humano, que existem milhares de histórias semelhantes à minha, ou seja, histórias de dor, desafios, medos, traumas e crenças, mas que podem ganhar um novo significado a partir de uma compreensão e um alinhamento ao propósito de vida de cada um.
Você diz que muitos adultos se reconhecerão nela. Por quê?
Porque sofrimento, angústia, frustração, medo... fazem parte da nossa vida. A partir do momento em que cada um descobre o seu grande "para quê", ou seja, o seu propósito de vida e se alinha a ele, há uma ressignificação.
Você também diz que, por trás das histórias de vida dos que buscam mudanças na vida profissional, "há muitas mágoas, medos e traumas que precisam ser desnudados para que eles sigam adiante". Pode exemplificar?
Posso citar como exemplo estudos realizados sob a ótica da psicologia positiva, que apontam para a importância de darmos ênfase aos aspectos positivos da vida, como focar nossas forças [talentos, habilidades, paixões, recursos e valores], reduzindo a atenção para os acontecimentos ruins do passado. Não significa "fechar os olhos" para esses aspectos, mas encará-los sob uma perspectiva positiva. É preciso perdoar e honrar o passado se quisermos continuar a evoluir.
O índice de insatisfação e infelicidade no ambiente corporativo estão altos? Por quê?
Os índices continuam altos, entretanto, muitas vezes o problema não é o ambiente corporativo, mas a falta de identificação e alinhamento com o propósito. O autoconhecimento é a melhor forma de encontrar as respostas, porque propósito de vida é um conceito idiossincrático, assim como felicidade e sucesso.
Muitos especialistas defendem que o principal motivo desse descontentamento é a definição da profissão muito cedo ou através de imposição dos pais. Como você avalia isso?
Em um programa que criei para adolescentes em busca de suas melhores escolhas profissionais, juntamente com uma amiga que é Ph.D em neurociência, foi constatado que ambas as colocações são comuns.
Escolher a carreira muito cedo, em função de uma pressão cada vez maior, tanto por parte do mercado de trabalho e da sociedade quanto das escolas, pode resultar em uma escolha equivocada.
Por outro lado, os pais, na tentativa de ajudar seus filhos a decidir de forma prática e assertiva, muitas vezes querem aproveitar o caminho já pavimentado por eles. Exemplo: um pai que é médico e conhece os caminhos para se obter sucesso nessa profissão pode cometer o equívoco de não observar as aspirações naturais em relação à preferência profissional do seu filho. É fundamental a participação e o apoio dos pais nessa tomada de decisão tão importante, sobretudo voltando o olhar para o que, de fato, deixará seu filho feliz.
Outros defendem que trabalhamos a vida inteira sem um propósito definido e no automático, apenas para ganhar dinheiro. Você concorda?
Muitas pessoas ainda escolhem suas carreiras com base nas necessidades e oportunidades para o momento ou considerando somente o aspecto financeiro, sem olhar para o fato de que o bem-estar, aspiração natural do ser humano, está muito mais associado ao seu desenvolvimento integral, ou seja, à consideração em relação a outras áreas que também são importantes. Ao descobrir e viver o propósito, as pessoas integram essas áreas em suas vidas com maior facilidade, tornando-se pessoas realizadas e felizes.
Descobrir nosso propósito de vida, significa, necessariamente, entrar em contato com feridas até então desconhecidas?
Não necessariamente. Talvez um bom começo seja criar uma lista das coisas que queremos. E, se não soubermos, começar listando o que não queremos.
Pode ser que a descoberta do propósito de vida esteja no fato de olharmos a vida sob outras esferas e não apenas por outros ângulos como aprendemos. Talvez seja necessário acessar áreas da vida que nos causaram ou ainda nos causam dor. Pode ser que tenhamos que refutar histórias que escutamos ao longo da vida de pessoas que nós admirávamos e que nos amavam e acabaram nos aconselhando a fazermos escolhas com base no que elas acreditavam ser o melhor para nós.
Talvez tenhamos que considerar a possibilidade de o propósito estar em outra área além do trabalho, o que não significa que é preciso parar de trabalhar para viver esse propósito, muito menos trabalhar no que não gosta. Talvez tenhamos que aprender a parar de lutar contra o medo e colocar mais foco e energia no exercício da nossa coragem. Talvez tenhamos que perguntar para as pessoas com as quais convivemos sobre o que elas veem de melhor em nós e o que elas percebem que poderíamos fazer com naturalidade, reforçando nossa autenticidade.
Pode ser que tenhamos que parar, olhar para dentro, pedir licença para a nossa mente barulhenta e ouvir a voz do coração. Pode ser que acessar nossos sonhos mais amados de infância, lembrar daquela paixão que nos movia a acreditar que a vida era pura diversão, porque tínhamos o nosso jeito natural e espontâneo de nos divertir. Talvez tenhamos que olhar através da janela da nossa alma e nos permitirmos desenhar a vida que o criador sonhou para nós.
É um processo dolorido? Quais os passos nessa jornada? Ela geralmente acontece na meia-idade?
Encontrar o propósito nem sempre é um processo dolorido ou requer uma mudança radical. O primeiro passo acredito que seja sentir a voz do coração e o despertar do querer. Outro passo importante é buscar o autoconhecimento, muitas vezes contando com profissionais que poderão auxiliar nesta jornada que por si só determinará os passos seguintes. Não há idade, ele acontece a partir do momento em que se sente a voz da alma falando mais alto.
Uma pessoa que encontra um sentido para o que faz vai viver mais e melhor?
Com certeza! O livro é um registro de como isso aconteceu na trajetória de Shanti. Todos nascemos para um propósito e, ao realinhar-se a ele encontramos sentido no que fazemos gerando assim maior sensação de prazer e bem-estar. Ao encontrar um sentindo para a vida, ela mudou radicalmente seu foco de direção, trabalhando o perdão, quebrando paradigmas e refutando verdades que ouviu de outros e até de si mesma; estabeleceu seus valores de forma mais congruente, alinhando-se com a sua verdadeira jornada.