Em primeiro lugar, vamos entender que a vontade sexual é acionada pela mesma energia que nos leva a querer dormir, comer e nos divertir com os netos.

Calma, calma. Se isso lhe parece novo e até mesmo um pouco revoltante, é porque falamos de uma única energia: a energia de vida, que nos impulsiona todo dia e a cada instante.

Essa energia tem várias expressões que emprestam força às vontades e às necessidades. As direções que toma e os motivos são diferentes, o conjunto todo, porém, ‘quer’ ou ‘busca’ a mesma coisa: prazer de viver ou, simplesmente, prazer. Na sua fonte original, essa energia quer viver e, para isso, precisa se auto proteger e, também, se auto perpetuar.


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Em outras palavras, trata-se da energia vital, chamada de Eros por Sigmund Freud, que foi o primeiro a ter tido a coragem de apresentá-la à vida acadêmica e que, por tal atrevimento, foi expulso da academia de medicina de Viena, no início do século 19.

Causou arrepios de horror em meio a uma época ainda impregnada de grande opressão às mulheres em sua prática sexual. Vivia-se a romântica era vitoriana, e às mulheres de família, às mulheres de bem, era negado o direito ao sexo com prazer. Foi nesse clima que Sigmund Freud ousou afirmar que crianças também sentem prazer erótico.

Hoje em dia, pais e mães se divertem com seus bebês, quando os veem manipular seu corpinho, seus genitais e se propiciar experiências de prazer. E que prazer eles sentem! Chegam a gargalhar! São experiências ao modo ingênuo e as praticam sem pudor. Eles e elas se tocam, se exploram, a si e aos amiguinhos, da maneira mais natural e curiosa possível, por que, simplesmente, é muito gostoso fazê-lo.

Os colegas de Freud ficaram irados. Ele tomara de empréstimo o termo erótico, inspirado no nome do deus Cupido, da mitologia grega e, pioneiro na área médica e da psiquiatria, foi visto por seus pares como um lunático, que estava desvirtuando tudo e não sabia nada! Causou, porém, grande celeuma e logo seus adeptos se multiplicaram e deu-se início à grande revolução na área do conhecimento sobre a sexualidade humana.

Eros, afirmou ele, nada mais é do que a energia de vida, aquilo que nos dá prazer e faz com que evitemos a dor, nos protegendo, nos apaixonando, nos envolvendo com aqueles – e aquelas – que nos atraem e que, sendo isso natural é, portanto, inevitável.

Afirmou também que mulheres histéricas são aquelas que não têm vida sexual com satisfação. Foi com estas primeiras e revolucionárias ideias que as mulheres começaram a ganhar o direito ao prazer. Embora Freud tenha dito que as mulheres têm inveja do pênis – porque seriam incompletas – na verdade elas sentiam inveja do falo, o símbolo do poder que os homens tinham e ainda têm, além do domínio quase total sobre as mulheres.

Não nos esqueçamos de que Freud era bastante machista, em que pese tenha reconhecido e conferido às mulheres o direito a uma vida sexual feliz. O tamanho desta virada foi incomensurável. Antes dele, na cultura europeia, elas só tinham obrigações, mas não de usufruir do sexo e ter seus longos e magníficos orgasmos. Ao menos as casadas não poderiam.

Não fossem as prostitutas, as amantes, as mulheres ‘não sérias’, as mulheres que ‘nasceram’ para agradar aos homens, as que ‘cediam’ antes da hora, o magistral pintor Toulouse Lautrec jamais haveria de ter pintado a vida noturna parisiense com seus prazeres mundanos.

As esposas, filhas e irmãs jamais deveriam ter qualquer contato com essas mulheres de maus costumes, tidas como perversas e pervertidas. Devido a tal desprezo, nossa sociedade passou a considerar as viúvas e as separadas como muito perigosas! As mães solteiras e as que haviam perdido sua virgindade antes de se casar, também não eram nada recomendáveis. E, pasmem, esses preconceitos, nalgum grau, perduram até os nossos tempos.

A coisa é intrincada, porque é a partir dessa negação do direito ao prazer que muitas mulheres ainda são mal vistas, especialmente as mais velhas que, sendo viúvas e animadas, despertam a desconfiança de outras mulheres e também o apetite de alguns homens. Estes, porém, continuam dando preferência quase que absoluta às mais jovens, à exceção daqueles que afirmam que ‘panela velha é que faz comida boa’. A questão nem é tanto a idade da mulher, mas a idade em si. Tanto para elas, como para eles.

Não sei, sinceramente, qual binômio sentimento-pensamento é mais pesado de se carregar, enquanto preconceito. Se a ideia de que a mulher madura que se apresenta como parceira sexual está se achando, já que não está com nada em matéria de sexo, ou a ideia de que um homem que não consegue ou se desinteressa pelo sexo já não é mais homem. Os preconceitos nos atacam por tudo quanto é ângulo.

Um número marcantemente alto de mulheres maduras que hoje em dia estão sozinhas diz com ares de triunfo e libertação: - Cueca na gaveta? Jamais. Passou a hora. Agora, só pendurada na maçaneta da porta. Quem gosta de velho é doença. Quero mais é sair, me divertir. Se ficar doente, devolvo para a família. Não preciso de homem. Já passou a fase!

Mulheres de idade que vão aos bailes contratam professores de dança, personal trainers, porque gostam de dançar, mas não com aquela velharada tudo caindo aos pedaços! O desprezo com que homens e mulheres se referem uns aos outros é doloroso e deprimente. Elas viram bagulhos, eles viram cacos. E se relacionar com mais jovens é algo que fica longe demais: - Quem vai querer uma velha como eu, toda pelancuda, sem peito nem mais nada?! Homem novo, quando pega uma quer mais é o dinheiro dela! Os homens, por seu turno, se desacreditam: - Não dou mais conta! Com essa aí, quem entrar tem que aceitar uma dividida.

É o movimento antagônico a Eros, energia física e mental que se auto preserva, que entra em conflito com a energia de oposição, que é autodestrutiva e que também destrói a tudo e a todos que nela ‘pegam carona’. Esse conflito de vida e morte é permanente, desde o nascimento até a morte. Trata-se de Thanatos, também um deus menor, na mitologia grega.

Observamos a ação de Thanatos, a pulsão de morte, nos preconceitos que alimentamos em relação a nós próprios e contra as demais pessoas. Os preconceitos se intensificam sempre que nos tratamos com desprezo e aversão. Uma das piores formas de ódio é aquela que se dirige contra a própria pessoa, negando-se ao prazer e à fruição da sexualidade que está modificada, sim, mas que nem por isso deixa de ter suas formas e suas nuances.

Thanatos pulsa o tempo todo, mesmo quando estamos tendo muito prazer. Há práticas sexuais que são perigosas e que nos fazem mal. Nós é que precisamos aprender, treinar e nos autoanalisarmos para ganhar maestria ao lidar com esse duelo de forças em nós.

Se a nossa psique se antecipar à morte física, sem maestria corremos o risco de negar a nossa libido, a vitalidade e o desejo, especialmente nas idades mais avançadas. Uma pessoa doente que ainda se mantém desejosa é tida por indecente, imprópria e quase ninguém se atreve sequer a conversar com essa pessoa, a orientar um homem ou mulher acamada, por vezes nas últimas, como se diz. As piadas sobre homens acamados que passam a mão no traseiro das enfermeiras são muito grosseiras. Refletem a nossa ignorância. E medo, porque sempre temos medo daquilo que não conhecemos.

Situações de stress prolongado, uma anemia que se instala em nosso corpo, mais por desnutrição do que por falta de alimentação, dores nas costas que não são bem tratadas e cuidadas, cirurgias desnecessárias, medicações que poderíamos dispensar para manter nossa saúde genital caso fizéssemos os exercícios recomendados, ah, quanta dor as pessoas carregam consigo e se causam, porque preferem ir direto para uma cirurgia pélvica, antes de fortalecerem a musculatura adequada para reverter a incontinência urinária...

Existe um sem número de doenças que invalidam a nossa sexualidade tal como ela vinha sendo praticada e insistimos em nos manter na ignorância. Lemos que a dor artrítica melhora com um sexo gostoso, mas não acreditamos. Que o sexo bom ajuda na recuperação de um ataque cardíaco, mas não vamos atrás de saber o que é sexo bom e bem feito. Sempre pensamos que seria como o sexo de sempre. E se tiver que ser diferente, então, deixamos de lado ou não validamos as novas descobertas.

Os segredos são trancados a sete chaves, e somos muito pobres em sensualidade. Decretamos a morte da sexualidade em nossas vidas muito precocemente! Pessoas com Alzheimer ficam felizes quando trocam carícias sensuais. Pessoas acamadas se recuperam mais rápido quando não se rendem às dificuldades causadas por um AVC.

Vocês podem exclamar: - Mas tudo se resume a sexo? - Não, eu digo, nada se resume somente a sexo. Mas muita coisa boa míngua na vida de uma pessoa e de um casal quando eles e elas se recusam a sair do sexo básico e convencional, exatamente quando a situação requer mudanças e adaptações. As pessoas lançam maus olhados para si ao se desprezarem, ao se considerarem mais velhas, mais feias e menos interessantes. E se desqualificam para um bom sexo quando param de tecer fantasias sensuais que animam, com certeza, as práticas sexuais.

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