Por natureza, o corpo feminino tem uma grande vantagem quando o assunto é o risco de doenças cardiovasculares: as mulheres, durante seu período fértil, contam com os efeitos protetores do estrogênio, hormônio que estimula a dilatação dos vasos, otimizando o fluxo sanguíneo para o músculo do coração através das artérias coronárias. Ou seja, nessa época, as chances de um infarto ou do desenvolvimento da doença arterial coronária (DAC) são bem menores.

Isso não quer dizer, no entanto, que elas estão livres dos problemas no coração. O fato é que, desde a puberdade, as mulheres estão expostas a fatores que agridem o sistema cardiovascular. Por isso, é preciso entender que os perigos existem, porém, após a chegada da menopausa, geralmente por volta dos 45 ou 50 anos, eles ganham um peso maior.

O que muda com a menopausa?

Quando ocorre a parada definitiva da menstruação, resultante da perda da atividade folicular ovariana, a mulher perde a proteção do estrogênio. A partir dessa fase, passa então a ficar mais suscetível ao risco das doenças do coração. Há também uma tendência do aumento do colesterol e fica mais difícil controlar a glicemia (nível de açúcar no sangue), isso combinado a outros fatores.

Segundo dados apontados pelo HCor (Hospital do Coração), na época da menopausa 40% das mulheres apresentam aumento da circunferência abdominal, mais de 20% fumam, 18% são ex-fumantes, 23% têm seus níveis de pressão arterial acima do preconizado, 21% possuem alteração dos níveis de colesterol e 15% são portadoras de diabetes - agentes considerados de risco para eventos cardiovasculares, como o desenvolvimento da DAC.

E não há marcador biológico certo. As alterações fisiológicas associadas à menopausa começam a ocorrer alguns anos antes da última menstruação. Os sintomas mais comuns são os vasomotores (fogachos) e os vaginais (como a diminuição da lubrificação vaginal e dor durante o ato sexual), embora também possam surgir outros, como redução da libido, cansaço, suores noturnos que interrompem o sono, insônia, irritabilidade, ansiedade e depressão. Vários estudos sugerem inclusive que os sintomas vasomotores podem estar associados aos resultados adversos para o sistema cardiovascular e ósseo.

Mas os riscos começam muito antes...

A proteção durante o período fértil da vida não quer dizer, como mencionado acima, que está excluída completamente a possibilidade do surgimento de problemas cardiovasculares até em mulheres jovens, mas os riscos são menores. É preciso analisar fatores genéticos e outras complicações que merecem atenção.

A incidência de DAC em familiares próximos, como avós, pais, tios ou irmãos, por si só, já é um sinal de alerta. Além da predisposição genética, ainda temos outros pontos que devem ser considerados, como a síndrome do ovário policístico, uso de incorreto de anticoncepcional, tabagismo, sedentarismo, obesidade, estresse, depressão, ansiedade, quadros de hipertensão arterial, diabetes e alterações dos níveis do colesterol (com aumento do nível de gordura no sangue). Nesses casos, a chance do surgimento da doença arterial coronária é grande – mesmo com o benefício de proteção às artérias dada pelo estrogênio.

Em relação ao anticoncepcional, o uso sem recomendação médica e em doses incorretas, pode transformá-lo em um vilão para o coração. Isso porque a pílula possui estrógeno sintético que, nessa situação, ao invés de ajudar, agride os vasos sanguíneos. A pílula ainda pode aumentar a pressão arterial, os riscos de trombose, além de estimular a produção de coágulos nas artérias coronárias.

O coração da mulher moderna

Cada vez mais, as mulheres estão assumindo o protagonismo em diversas áreas da sociedade. No mercado de trabalho, a presença feminina é mais expressiva dia após dia. Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), até 2030, a participação das mulheres no mercado de trabalho brasileiro deve crescer mais do que a masculina. Porém, nem tudo caminhou da mesma maneira. Responsabilidades com a casa e a família não foram amenizadas na mesma proporção.

Levantamento da Consultoria IDados, realizado com base nos números do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), revela que o número de mulheres que são responsáveis financeiramente pelos domicílios vem crescendo a cada ano e já chega a 34,4 milhões. Isso significa que quase metade das casas brasileiras são chefiadas por mulheres.

Embora esse peso esteja melhorando com a divisão de tarefas e as novas realidades familiares, ainda acaba gerando uma sobrecarga enorme, que para muitas culmina em estresse. E quando enfrentamos uma situação estressante, o cérebro estimula glândulas a secretar hormônios que aumentam a pressão arterial e a frequência cardíaca. Por isso, em casos de estresse contínuo, o corpo acaba enfrentando a situação muitas vezes, o que pode desencadear eventos cardíacos graves.

Além do estresse, o efeito cumulativo de tantas atividades favorece hábitos pouco saudáveis, como o sedentarismo e a má alimentação. O tabagismo, a falta de atividade física regular, o consumo excessivo de bebida alcoólica e alimentos com altos índices de colesterol e gordura contribuem para a obstrução das artérias coronárias. É o cenário perfeito para um infarto ou um derrame.

As mulheres se preocupam mais com o câncer do que com doenças cardiovasculares

De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), as doenças cardiovasculares são causadoras de um terço de todas as mortes de mulheres no mundo, o que equivale a cerca de 8,5 milhões de óbitos por ano, ou seja, 23 mil por dia, tornando-se a principal causa de mortalidade entre elas.

No caso das brasileiras, principalmente acima dos 40 anos, as cardiopatias chegam a representar 30% das causas de morte. Estima-se que diariamente 200 mulheres vão a óbito no país em decorrência de doença cardiovascular. E os casos não são só na fase da menopausa. Cada vez mais mulheres de todas as idades, surpreendentemente as mais jovens inclusive, têm sido vítimas de eventos cardiovasculares fatais.

O curioso, no entanto, é que elas se preocupam mais com o câncer do que com os problemas no coração. No Brasil, cerca de 54% morrem por doenças do coração, como o infarto, enquanto o câncer de mama é a causa de morte de 14%.

Prevenção 

Diante deste panorama, é fundamental que as mulheres realizem avaliações médicas periódicas. Aquelas que já se enquadram no grupo de risco não devem esperar o período da menopausa, mas fazer um checkup mesmo antes dos 30 anos, principalmente quando há pré-disposição genética ou algum sintoma recorrente.

Além disso, é importante realizar uma boa avaliação cardiovascular alguns anos antes da chegada da menopausa. Por volta dos 40, a indicação são de consultas anuais (ou de acordo com a intensidade dos fatores de risco), uma vez que ela já se encontra na fase da pré-menopausa e o nível de estrogênio começa a cair. Assim é possível dar início a uma estratégia de redução de danos para cada situação apresentada. Em alguns casos, quando há a necessidade de reposição hormonal, a interação entre ginecologista e cardiologista é importante.

Depois dos 50 - ou já na fase da menopausa propriamente – passa a ser indispensável fazer uma avaliação, no mínimo, uma vez por ano. Em quadros com os agravantes mencionados acima, a visita ao cardiologista deve ser mantida com os intervalos de quatro ou seis meses – ou de acordo com a orientação médica.

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