Houve uma época em que o treinamento resistido – aquele de resistência, que geralmente usa pesos – estava vetado para quem tem hipertensão. Uma das hipóteses era a de que poderia agravar a remodelação cardíaca de quem tem pressão alta.
Explica-se: nos hipertensos, devido à sobrecarga de pressão do sangue nas artérias, há uma série de alterações no coração. O temor, não confirmado, é de que a musculação pudesse interferir negativamente nessa condição de duas maneiras: 1) produzindo elevação da pressão e 2) agravando a remodelação do miocárdio.
Vale lembrar que uma em cada quatro pessoas no Brasil diz ter hipertensão, segundo pesquisa do Ministério da Saúde. Ou seja, até pouco tempo atrás, o treinamento resistido era desaconselhado para uma boa parcela da população.
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Mas pesquisas têm indicado que o treinamento resistido pode ser o mais eficiente tipo de exercício para estimular a produção de miocinas, substâncias anti-inflamatórias produzidas pelo músculo esquelético em atividade, segundo o fisiatra e reumatologista José Maria Santarem, coordenador do Instituto Biodelta. Dessa forma, é possível “evitar a aterosclerose e, consequentemente, as doenças cardiovasculares”.
Treinamento resistido: evidências
O médico diz que os estudos mais recentes mostram que a pressão arterial se eleva muito quando são feitos esforços máximos no treinamento resistido. No entanto, isso é comum para atletas em competições, não para pessoas que fazem treinos regulares para obter hipertrofia e força muscular.
É verdade que o treino habitual provoca hipertrofia induzida – a remodelação do miocárdio citada anteriormente. Mas, segundo Santarem, ela é fisiológica e não apresenta efeitos adversos para a saúde. “A doença hipertensiva implica sobrecarga aumentada para a contração do ventrículo esquerdo, levando à sua hipertrofia, que nesse caso é classificada como patológica. Esse tipo de hipertrofia é diferente da induzida por exercícios.”
Santarem cita ainda uma revisão da literatura que analisou 64 trabalhos, com um total de 2.374 participantes com hipertensão, sobre o efeito redutor da pressão arterial de repouso do treinamento resistido não associado a outras formas de exercício. Resultado: esse tipo de atividade física foi eficaz. “As evidências sugerem que duas a três vezes por semana sejam suficientes [para a redução da pressão arterial], mas essa questão ainda precisa ser mais bem investigada.”
Treinamento resistido: começando
Quem quiser começar com os treinos de musculação deve se ater aos objetivos habituais: “Estimular primariamente o aumento de força e de volume dos músculos”, segundo o médico. A pessoa vai notar outros benefícios, como melhora na potência, na resistência, na coordenação e na elasticidade muscular.
Mas puxar pesinhos com o intuito único de regular a pressão é um erro. “Não há evidências para propor treinos com características específicas para tratar a hipertensão arterial sistêmica.”
Crédito: Flamingo Images/Shutterstock
Pessoas que estão hipertensas necessitam, inclusive, evitar esses exercícios. “Medicamentos devem ser utilizados para manter a pressão arterial em níveis normais. O que se espera com o tempo é uma redução das doses.”
Ele complementa: “O início de qualquer atividade física deve ser orientado por pessoas com experiência na área. Os profissionais de educação física estão preparados para essas orientações”.
Na musculação
O profissional de educação física Mário Vergari Filho, integrante do grupo de estudos e pesquisas Neuroexerscience - USP, diz que exercícios isométricos podem contribuir com a melhora da pressão arterial em repouso. Ele explica: “São exercícios de propriedade estática, em que você realiza o movimento e, no meio do percurso, fica imóvel pelo maior tempo possível”.
Além de ser uma técnica de esforço relativamente baixo e de simples entrega de resultados, facilitam a aderência da pessoa ao exercício, segundo o especialista. A frequência ideal dos isométricos é de quatro a seis vezes por semana, em sessões de 30 a 60 minutos. Vergari Filho diz que podem ser feitas de uma a três séries por exercício, com intervalos de descanso de um a dois minutos.
É possível ainda trabalhar com exercícios de movimentação contínua, sugere o profissional de educação física. Nesse caso, o indicado é de uma a três séries de leve a moderada intensidade, com entre oito e dez repetições do movimento. A velocidade tem de ser de lenta a moderada, os exercícios devem envolver mais de uma articulação, e os descansos precisam ficar entre um e dois minutos.
“A intensidade do exercício varia de acordo com o histórico clínico do paciente e a avaliação subjetiva de esforço durante todo o treino”, informa Vergari Filho. Segundo ele, para maior segurança, é preciso aferir a pressão arterial antes do início da atividade e ao seu término. “Vale lembrar também que a prática de exercícios físicos deve ser constante e habitual, para que você se sinta cada vez melhor fisicamente e clinicamente.”