Os juros no crédito pessoal são mais elevados para os mais pobres e para as mulheres, mesmo sem risco maior de calote. A constatação faz parte de um estudo publicado pelo Banco Central, que investigou a relação entre renda, gênero e taxas cobradas por instituições financeiras no Brasil.
Segundo o levantamento, existe uma relação inversa entre renda e taxas de juros. Trabalhadores que recebem entre 1 e 2 salários-mínimos pagam de 28 a 44 pontos a mais do que os que recebem acima de 20 salários. A taxa média do crédito pessoal no período de 2013 a 2019 foi de 146% ao ano.
Essa diferença acompanha uma escada de rendimentos. Quem recebe de dois a três salários paga até 32 pontos a mais. Entre três e cinco salários, a diferença é de até 22 pontos. De cinco a 10 salários, são 11 pontos a mais. Já de 10 a 20 salários, o acréscimo fica em até 2,5 pontos.
“Mesmo desconsiderando-se diversos fatores, como o risco de crédito, a conclusão é que as pessoas com renda mais baixa continuam pagando juros mais altos”, afirmou Fernando Chertman, professor de macroeconomia e economia matemática da Faculdade Belavista, à Folha de S.Paulo.
Mulheres também enfrentam juros no crédito pessoal mais altos
A desigualdade não se restringe à renda. O estudo também mostrou que as mulheres pagam até 8,2 pontos percentuais a mais de juros no crédito pessoal em relação aos homens. Essa diferença ocorre mesmo sem risco maior de inadimplência.
“As mulheres arcam com taxas de juros maiores inclusive que os trabalhadores informais, que pagam juros entre 2,8 pontos a 4,1 pontos mais altos do que os formais”, destacou Amanda Fantinatti, professora de economia da FEA-USP, também à Folha.
Os especialistas utilizaram modelos estatísticos com dados do Banco Central e da Rais (Relação Anual de Informações Sociais). A partir disso, calcularam a probabilidade de inadimplência de diferentes perfis de trabalhadores. Depois, isolaram os efeitos do risco de crédito e de outras variáveis, como idade e valor do empréstimo.
Mesmo assim, os mais pobres e as mulheres continuam enfrentando juros no crédito pessoal mais altos. Os pesquisadores ressaltam que não é possível determinar, apenas pelos dados, as causas exatas dessa diferença. Mas algumas hipóteses foram levantadas.
Uma delas é a influência do preconceito presente na sociedade brasileira. Essa percepção pode levar agentes financeiros a verem maior risco de inadimplência entre os mais pobres, mesmo sem evidências. Outro fator é o menor acesso da população de baixa renda à educação financeira, o que reduz a capacidade de negociação com os bancos.
Crédito: Sidney de Almeida/Shutterstock
Desigualdade aparece também no crédito consignado
O levantamento indicou que a desigualdade persiste até no crédito consignado. Esse tipo de empréstimo costuma ter risco reduzido porque está atrelado a salários ou benefícios. Mesmo assim, a relação inversa entre renda e juros no crédito pessoal foi identificada nesse segmento.
No caso das mulheres, os autores lembram que elas são historicamente pior remuneradas. Assim, parte da diferença pode refletir mais a renda do que o gênero em si. “Não é possível extrapolar os dados e chegar à conclusão que necessariamente é preconceito. Essa descoberta do estudo reflete as próprias desigualdades de gênero, que fazem com que as mulheres sejam pior remuneradas”, explicou Chertman.
Educação financeira reduz juros no crédito pessoal
Outro ponto analisado foi o impacto da educação financeira. Trabalhadores de profissões ligadas às exatas, como engenheiros e matemáticos, pagam juros até 1,3 ponto percentual menores. O estudo aponta que esses profissionais costumam ter mais conhecimento e sabem negociar melhores condições.
“Pessoas com maior educação financeira chegam no banco e conseguem negociar”, disse o professor da Belavista. O levantamento também concluiu que, se as taxas mais elevadas fossem revertidas para os consumidores, o consumo poderia crescer em média 2,6% ao ano. Esse aumento teria efeito maior entre os mais pobres e os trabalhadores informais.
Caminhos para reduzir desigualdades
Na visão dos pesquisadores, ampliar o acesso à educação financeira é um caminho essencial. “Será que implementar educação financeira nas escolas não poderia ter um impacto até maior do que outras políticas? É algo que todo mundo deveria aprender porque tem impacto relevante na vida das pessoas”, afirmou Fantinatti.
“A conclusão do estudo é que a cidadania financeira, a inclusão e o conhecimento sobre finanças têm um impacto significativo sobre os juros”, reforçou Chertman.
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