Para começar, um dos principais mitos que devemos entender sobre o coração é: envelhecer não é sinônimo de adoecer! Muito do que as pessoas temem sobre a chamada terceira idade não são necessariamente verdadeiras ou regra para todos. As alterações estruturais e funcionais que ocorrem no processo de envelhecimento facilitam, sim, o desenvolvimento de doenças cardiovasculares. Facilitam, porém, não são determinantes.
Com todos os anos que tenho de experiência posso afirmar que não é difícil encontrar pessoas que já passaram dos 60 anos, alguns até dos 80, e seguem com corações em pleno funcionamento, com o órgão no tamanho normal, artérias coronárias sem qualquer obstrução e válvulas em dinâmica adequada. E não estou falando de exceções.
Conheça alguns mitos sobre o coração. Crédito: Explode / Shutterstock
Tudo vai depender muito do histórico, estilo de vida e cuidados que cada um tem ao longo dos anos. Grande parte dos efeitos adversos do envelhecimento, tidos como inevitáveis, na realidade não são. Podemos falar aqui de prevenção e manutenção vitalícia. O como você vive ao longo da sua caminhada vai interferir diretamente na sua velhice, aumentando ou diminuindo suas chances de viver mais tempo, com qualidade e de forma ativa.
Livre de fatores de risco ou com eles sob controle, como a pressão alta, tabagismo, diabetes, obesidade e sedentarismo, o coração será poupado, sendo possível se manter normal. É hora de quebrar certos paradigmas e entender o que é verdade e o que é mito em relação a saúde cardiovascular.
9 mitos sobre o coração
Mito #1: Pessoas magras e aparentemente saudáveis não têm risco de apresentar doenças no coração
Não há dúvidas de que pessoas com a circunferência abdominal adequada e, portanto, sem o fator de risco da gordura abdominal, apresentam menos chances de desenvolver a doença arterial coronária. Porém, esse é apenas um ponto a ser analisado entre tantos outros. Até mesmo aqueles que praticam esportes regularmente podem estar em risco de uma doença cardíaca.
Há muitas condições envolvidas, como maus hábitos alimentares, pressão sanguínea elevada, dislipidemia (altos níveis de gorduras no sangue) e tabagismo. Esses fatores superam a vantagem da ausência da obesidade e podem determinar o desenvolvimento ou agravamento da doença coronária, independentemente da pouca gordura corporal.
Além disso, uma pessoa aparentemente saudável pode ter uma cardiopatia congênita ou adquirida, mas não diagnosticada, com a possibilidade até de sofrer um infarto fulminante - isso sem nunca ter apresentado qualquer sintoma. Por isso, é importante não se deixar levar apenas por aparências e fazer uma avaliação cardiológica para análise de fatores e definição do verdadeiro risco cardiovascular de cada indivíduo.
Mito #2: Ataques cardíacos sempre apresentam os mesmos sintomas
Enquanto você acredita que um ataque cardíaco sempre envolve uma dor torácica extrema, segundo a Associação Americana do Coração (AMA), aproximadamente 64% das mulheres que morrem repentinamente em decorrência da doença coronariana não apresentaram nenhum sintoma. As mulheres geralmente sentem outros sinais, como dor nas costas, na mandíbula, tonturas e vertigens, falta de ar ou náuseas e vômitos.
A dor no peito é realmente um sintoma característico da isquemia miocárdica e do infarto. Entretanto, não está presente em todas as situações cardíacas agudas. Há pessoas que não apresentam nenhuma dor ou sinal e ainda assim estão tendo um ataque cardíaco, como acontece com alguns pacientes com diabetes. Portanto, a dor no peito não é a única manifestação do infarto do miocárdio. Outros sintomas, como falta de ar, dor na boca do estômago, dor na mandíbula ou dor nas costas, podem ocorrer. Por isso, atente-se ao seu corpo. Ao notar qualquer sintoma diferente, procure orientação médica.
Mito #3: Uma vez que você tem uma doença cardíaca, dependendo da idade, é tarde demais
Nunca é tarde para tratar ou prevenir doenças cardíacas. O estilo de vida tem um papel crucial tanto no controle dos fatores de risco quanto no cuidado com as doenças já existentes. Entenda que prevenção não tem idade. Muitos dos efeitos do envelhecimento sobre o coração e os vasos sanguíneos podem ser reduzidos com hábitos saudáveis, como alimentação e a prática regular de exercícios, que ajudam a manter a capacidade cardiovascular, massa magra e a forma física.
Além disso, manter seu check-up médico em dia é fundamental. A recomendação para as mulheres que não apresentam fatores de risco, sintomas e histórico familiar, é iniciar esse acompanhamento cardiológico entre 35 e 40 anos. Para os homens, a partir dos 35 já é indicado - isso até os 50 anos. No caso dos idosos, mesmo aqueles sem doenças, é aconselhável um acompanhamento com periodicidade menor, a cada 6 meses.
Mito #4: Se você tem doenças cardíacas deve evitar atividades físicas
A prática de exercícios rotineiramente contribuí até para aqueles que passaram boa parte da vida de forma sedentária e só optaram por mudar esse hábito após a maturidade. A atividade física ajuda a fortalecer o músculo cardíaco, melhora o fluxo sanguíneo, a saúde e o bem-estar de modo geral.
No entanto, é fundamental ter cautela. E isso vale para qualquer pessoa que deseja iniciar um esporte, principalmente em relação ao coração. Quando o órgão é exigido, reage de diversas formas. Se não estiver em boas condições, a experiência pode ter consequências negativas. Assim, antes de mais nada, converse com seu médico sobre o tipo de exercício que seria adequado para você.
Em pacientes com angina, por exemplo, a recomendação é que o quadro melhore para avaliar a possibilidade da realização de atividades físicas. Já no caso de cardiomiopatia hipertrófica, a prática de exercícios não é indicada (doença em que o músculo do coração tem uma porção do miocárdio hipertrofiada sem nenhuma causa óbvia, gerando uma deficiência no seu funcionamento). Ou seja, ter uma cardiopatia ou alguma enfermidade no coração não significa a impossibilidade de se exercitar em nenhuma hipótese. Cada caso é um caso e as doenças podem se apresentar em níveis variados. Tudo dependerá de uma análise aprofundada do especialista responsável.
Mito #5: É normal ter a pressão arterial mais alta quando você já passou da meia-idade
A pressão arterial tende a aumentar com a idade. Porém, o fato de isso ser comum não significa que seja bom para a saúde e que deva ser tratado como algo normal. Com o passar dos anos, o controle da pressão se torna ainda mais importante.
O aumento ocorre porque as paredes das artérias se tornam mais rígidas, exigindo que o coração bombeie o sangue com força extra. Além disso, o excesso de trabalho do músculo cardíaco pode se tornar menos eficaz. Para compensar, o órgão acaba bombeando o sangue mais forte para conseguir atender às exigências do corpo, o que consequentemente pode danificar as artérias e dá possibilidade de placas de gordura entrarem e se estabelecerem por ali. Desta forma, a pressão arterial alta e sem controle adequado aumenta o risco de um infarto ou acidente vascular cerebral (AVC).
Outro mito relacionado ao controle da pressão arterial é em relação ao sal. Apenas tirá-lo da alimentação não basta. O excesso de consumo de sal acarreta no aumento da pressão e pode até ser o responsável pelo surgimento da hipertensão, mesmo na ausência de herança genética e outras patologias. No entanto, considerar que a correção da quantidade de sal na dieta é o suficiente para controlar a hipertensão arterial em todas as situações, não é verdade. Isso porque há outros fatores necessários, como o uso correto de medicamentos, assim como a necessidade da perda de peso e o abandono do sedentarismo.
Mito #6: Doença cardíaca é um problema que atinge mais os homens do que mulheres
Por muito tempo, os homens eram as principais vítimas das doenças cardiovasculares. O fato de ser do sexo masculino já era considerado um fator de risco. Para se ter ideia, há 10 anos mais ou menos, a proporção era por volta de quatro ou cinco homens para cada mulher. Porém, o número de casos entre elas vem aumentando. Hoje já é praticamente um para um.
E muito embora homens e mulheres compartilhem da maioria dos fatores de risco, existem diferenças. As mulheres tendem a desenvolver doenças cardíacas em média 10 anos mais tarde do que os homens, porém têm mais chances de morrer da doença. As cardiopatias chegam a representar 30% das causas de morte das brasileiras, principalmente acima dos 40 anos.
As mulheres têm corações e vasos coronários menores, o que muitas vezes torna a cirurgia cardíaca mais complexa. Além disso, após a chegada da menopausa, o risco de problemas aumenta para elas. Com a parada definitiva da menstruação, há a perda da proteção do estrogênio. Fabricada pelos ovários, essa substância é grande aliada do coração, uma vez que estimula a dilatação dos vasos, facilitando o fluxo sanguíneo. A partir dessa fase, há também uma tendência do aumento do colesterol e fica mais difícil controlar a glicemia, elevando ainda mais as chances de doenças cardiovasculares.
Mito #7: É possível reduzir o risco de doenças cardíacas com vitaminas e suplementos
De acordo com a Associação Americana do Coração, não há evidências científicas comprovando que suplementos de vitaminas antioxidantes E, C e o fator betacaroteno previnem ou tratam doenças cardiovasculares. Isso porque ensaios clínicos ainda não conseguiram confirmar os benefícios ou foram realizados de tal forma que não foi possível tirar nenhuma conclusão definitiva.
Assim, para garantir que você obtenha as vitaminas e minerais que precisa, a menos que seja indicado por orientação médica, evite os suplementos. O fato é que o corpo absorve e utiliza melhor as vitaminas e minerais quando eles são adquiridos através dos alimentos. Um prato de comida precisa ser o mais colorido possível, com a ingestão de frutas, verduras, legumes, cereais e grãos integrais, carnes magras e derivados de leite.
Mito #8: Se você tem doença cardíaca, deve comer o mínimo possível de gordura
Ainda falando em alimentação, outro mito comum é em relação ao consumo de gorduras. É verdade que é fundamental evitar tanto a gordura saturada como a trans. Porém, outras gorduras, especialmente insaturadas em óleos vegetais e outros alimentos, são benéficas. Comer, por exemplo, produtos lácteos com baixo teor de gordura, nozes, azeite de oliva e peixes gordurosos, entre aqueles ricos em ácidos graxos ômega-3, como o salmão, pode contribuir para a diminuição do risco de doenças cardíacas.
E quando o assunto é a alimentação e gorduras, fica outro alerta: quem toma medicamentos para controlar o colesterol, não pode descuidar da dieta e usar isso como um protetor. Os remédios reduzem a quantidade de colesterol que circula na corrente sanguínea. Esses medicamentos são necessários para controlar o colesterol alto, pois ajudam a remover o LDL (colesterol ruim) e aumentam o HDL (colesterol bom). Porém, é fundamental manter a alimentação equilibrada e saudável, como dito acima.
Mito #9: Se sua família tem histórico de doenças cardíacas, você está destinado a ter problema no coração
Embora fatores genéticos desempenhem papel relevante no risco de doenças cardiovasculares, isto não significa que aqueles com um histórico familiar estejam destinados a um evento cardiológico. O fato é que terão mais probabilidade. A palavra-chave aqui é prevenção, incluindo check-ups regulares, além de um estilo de vida saudável, com uma rotina de alimentação, exercícios físicos e monitoramento de pressão e colesterol, por exemplo.
A investigação e o acompanhamento, quando há registros de casos de pais e parentes próximos, é extremamente importante. Medidas preventivas podem diminuir significativamente as chances do surgimento de uma doença cardiovascular ao longo da vida ou ao menos retardar e minimizar ao máximo o seu desenvolvimento.