Estamos encolhendo e envelhecendo? A série histórica de crescimento populacional no Brasil mostra que o ritmo de crescimento da população brasileira é cada vez menor, resultado de uma queda acentuada na taxa de natalidade. Na década de 60, por exemplo, a população brasileira crescia 2,99% ao ano. De 2000 para 2010, o percentual estava em 1,17%. E os números divulgados nesta semana pelo IBGE, relacionados ao Censo 2022, mostraram crescimento anual de apenas 0,52%. Pela primeira vez, o avanço ficou abaixo de 1%. O fato é: somos menos do que os estudiosos da demografia brasileira esperavam, 203 milhões e não 213 milhões. E sim, a tendência é de envelhecimento da população.

Um país com cada vez mais idosos e cada vez menos crianças nascendo tem seus desafios. No mundo, há quem já viva cenários assim, caso dos países europeus. Mas o que precisa ser pensado e planejado desde já considerando que seremos mais longevos? Quais as demandas e necessidades específicas de uma população com mais pessoas acima dos 60 anos? O que precisa ser olhado nas políticas de saúde e educação, por exemplo, considerando o envelhecimento dos brasileiros?

Para entender quais os desafios que um menor crescimento populacional e um maior envelhecimento trazem ao país e à sociedade como um todo, ouvimos especialistas de diferentes áreas, que apontaram pontos que merecerão cada vez mais a atenção do governo e da sociedade.

Envelhecimento da população traz novas necessidadesFoto: Ground Picture/Shutterstock

Para começar, Longevidade deve ser vista como curso de vida

Para a médica gerontóloga Andrea Prates, pensar na tendência de envelhecimento da população é pensar em duas pontas. Uma delas relacionada aos idosos, que serão cada vez mais numerosos. A outra com relação às gerações que estão a caminho do envelhecimento, cujas demandas devem ser observadas em um aspecto mais preventivo, já que muitas questões da velhice normalmente são resultado do que veio antes.

“É o caso das doenças crônicas, por exemplo. Elas começam em faixas mais precoces. Por isso é preciso ampliar programas de promoção de saúde. Não se trata apenas de cuidar de doenças, mas de envelhecer com saúde e qualidade de vida. É algo complicado quando se trata de um país com uma desigualdade imensa, mas é preciso que pensemos nisso desde já”, avalia.

Outros pontos necessários levantados pela gerontóloga são o aumento da capilaridade do SUS em programas de medicina de família e o melhor aproveitamento do know how de pessoas com mais de 60 anos no mercado de trabalho. “Se o Brasil não aproveitou o bônus demográfico, é preciso criar uma nova cultura com relação ao trabalho, estimulando-se a extensão da vida produtiva das pessoas 60+”.

É preciso pensar em políticas públicas

De acordo com Lício Raimundo, professor de economia da FACAMP, as mudanças demográficas que o Brasil enfrenta não são abruptas, como acontece em situações extremas como uma guerra. Além disso, de certa forma, o envelhecimento da população já é algo esperado. “Nos anos 80, 90 começamos a ter um fenômeno de menor mortalidade infantil e maior longevidade. O brasileiro passou a viver mais e morrer menos na primeira infância. Isso, por si só, já geraria algumas mudanças. E considerando a tendência de envelhecimento é preciso que nos preparemos e nos organizemos como sociedade”, avalia.

Para Lício são necessários mais equipamentos públicos voltados para a terceira idade, com mais volume e intensidade do que há hoje. “Por exemplo, casas que recebam idosos, sobretudo os que não tem condições financeiras próprias nem familiares de se manter na velhice. É preciso pensar na pessoa que entra numa terceira idade com condição laboral cada vez mais atenuada. Ela muitas vezes é incapaz de ser inserida no mercado, tem uma poupança financeira pequena e uma condição familiar que não é propícia para seu atendimento. Quando situações assim começam a ganhar proporções demográficas importantes, precisamos de políticas públicas voltadas ao atendimento dessas pessoas”, afirma.

Produtividade é variável importante para o futuro

Sobre a tendência de, futuramente, haver um volume menor de pessoas economicamente ativas e um volume maior de pessoas inativas, o economista acredita que não deve ser motivo para pânico. “É um problema ter mais gente em idade avançada? Tudo dependerá do grau de produtividade que a sociedade brasileira consiga alcançar. Se esse crescimento compensar a queda na proporção de ativos e inativos, cada ativo estará gerando mais riqueza do que gerava antes. Também entra aí o crescimento da tributação. É preciso ver se o componente tributário acompanhará a produtividade maior para extrair recursos maiores para pagar a aposentadoria de quem não pode trabalhar mais”, opina.

Wagner Balera, professor titular de Direito Previdenciário da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, explica que a crise da previdência já é algo detectado há mais de quarenta anos. “Os estudos independentes e os do Banco Mundial demonstraram que o modelo previdenciário previu de maneira equivocada o incremento exponencial da população ativa e sempre crescente ampliação dos postos de trabalho. As duas previsões falharam e urge revisar o programa de proteção como um todo, em linha com parcerias necessárias entre os Estados e a comunidade. O foro adequado para essas mudanças é a OIT (Organização Internacional do Trabalho).”, afirma.

Educação Financeira será cada vez mais necessária com envelhecimento da população

Uma população com pessoas que estão vivendo cada vez mais precisa pensar em Longevidade Financeira. Ou seja, estar bem organizada financeiramente para que os anos a mais sejam acompanhados de equilíbrio nas finanças. De acordo com o educador financeiro Thiago Martello, da Martello EF, a maior parte das pessoas chega à velhice sem um planejamento relacionado ao dinheiro, o que prejudica, inclusive, as gerações mais novas.

“Foi feita uma pesquisa em que era perguntado por que as pessoas não conseguiam guardar dinheiro. Um dos principais motivos é porque precisavam ajudar a família. Não há nada de errado em ajudar, obviamente, mas quando uma geração não consegue criar riqueza porque tem que ajudar a geração anterior, estamos criando um ciclo de pobreza”, diz.

Ele afirma que o aumento da longevidade somado à diminuição da natalidade no Brasil requer uma atenção maior à vida financeira ao longo da vida. Isso para que, ao se chegar na velhice, não se tenha que depender tanto de governo ou familiares. “Eu atendo muitas famílias e é normal que quem tem filhos queira ajudar os filhos, mas é importante saber que não dá para doar o que ainda não se tem. O foco principal é aprender educação financeira para focar no próprio planejamento financeiro antes. Com isso, os filhos já estarão sendo ajudados”.

Cuidados paliativos são essenciais quando a população envelhece

Outro ponto importante relacionado ao envelhecimento que merece atenção é a questão dos cuidados paliativos. De acordo com Vera Bifulco, psicóloga, psicooncologista e mestre em Cuidados Paliativos pela Unifesp, a população idosa em Cuidados Paliativos vem crescendo, em um cenário em que as doenças crônicas, degenerativas, progressivas - graças aos avanços da Medicina e das drogas oferecidas - têm seus quadros estabilizados por mais tempo. "As demências, por exemplo, são doenças neurológicas com mais tempo em Cuidados Paliativos, chegando a 13, 20 anos de sobrevida. Os cânceres, que são doenças que também surgem como consequência do envelhecimento do próprio organismo mais hábitos de vida, são beneficiados com a abordagem paliativa, repassando aos pacientes uma melhor qualidade de vida com os sintomas controladoss", explica.

Segundo Vera, as terapêuticas oncológicas oferecidas aos pacientes idosos são bem toleradas. É preciso contudo entender que a abordagem para o paciente idoso é diferente da do paciente jovem. "O idoso geralmente não tem medo de morrer, seu grande medo é se tornar dependente, improdutivo, causando ônus a família. Entender o universo do idoso e seus questionamentos é uma realidade necessária e, muitas vezes, as equipes não estão tão preparadas para isso. Não falo do lado biológico, mas das esferas metais, psíquicas, socias, espirituais e culturais. É ímpar ir de encontro a seus anseios e desejos. Sou uma profissional idosa cuidando de pacientes idosos, isso cria uma atmosfera de pertencimento e intimidade, minha experiência de vida contribui para esse entendimento, mas devemos repassar aos profissionais jovens que estão se especializando na área, essa abordagem também, aproximando o profissional jovem do paciente idoso em todos os aspectos", avalia.

Profissionais precisam aprender a lidar com a velhice

Outra questão a ser discutida, segundo Vera, é a questão da formação acadêmica dos profissionais que virão a atender uma população mais velha. “Mesmo após a pandemia ela continua em boa parte online. Os jovens estão se formando sem a maturidade necessária porque a área de saúde precisa de olho no olho. O futuro da Universidade é delicado após a pandemia. O corpo teórico não te dá identidade profissional. Você tem que ter uma medicina de vivência, não só de evidência. De forma geral, diria que os profissionais precisarão entender cada vez melhor o perfil do idoso que estará sob cuidados paliativos. Eles não querem viver a qualquer custo, querem viver se tiverem qualidade de vida”, explica.

A falta de educação gerontológica também é um ponto citado pela médica Andrea Prates. Ela acredita que o Brasil precisará investir cada vez mais no tema, para expandir a compreensão de longevidade e ajudar a combater o idadismo. “A ampliação da convivência multigeracional no trabalho e nas escolas e uma formação de profissionais que saibam lidar melhor com a questão da velhice também será essencial. Precisamos de mais profissionais que entendam as implicações do viver mais. E elas são muitas!”, afirma.


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