Você já ouviu falar no termo “Etarismo econômico”? Talvez não, mas provavelmente já o sentiu na pele ou conhece alguém que tenha sentido. O  etarismo é classificado como um tipo de discriminação baseado na idade de alguém. Assim como ele, o etarismo econômico se manifesta com relação às questões financeiras que envolvem as pessoas com mais idade. Ou seja, é mais um tipo de preconceito com pessoas idosas.

Quem entra na chamada terceira idade, pode notar que é exatamente quando a renda tende a cair e os gastos a aumentar.  Algumas barreiras antes menores ou inexistentes passam a existir. Isso porque as instituições financeiras começam a dificultar algunas contratações. Como, por exemplo, de seguros, financiamentos - especialmente imobiliários - e créditos de todos os tipos.

No caso dos financiamentos imobiliários, a idade mínima para se começar um é 18 anos. Porém, a idade máxima pode variar de acordo com cada instituição. Boa parte deles costuma estabelecer os 75 anos para o término do financiamento. Ou seja, a partir daí pode ser bem mais difícil conseguir financiar. Há, inclusive, uma resolução da Superintendência de Seguros Privados que determina, no Brasil, que a pessoa disposta a financiar um imóvel deve quitar a dívida até completar 80 anos e seis meses.

Realidade preocupante

De acordo com João Adolfo de Souza, CEO e fundador da João Financeira e especialista em finanças,o etarismo econômico é uma realidade preocupante. Ele impacta a qualidade de vida dos aposentados, evidenciando uma falha grave no sistema socioeconômico.

“Observamos que, apesar de uma vida inteira de contribuições - seja construindo um histórico financeiro sólido, seja por meio do trabalho árduo -, os mais velhos enfrentam barreiras crescentes simplesmente por causa da idade. Isso manifesta-se de várias formas: desde dificuldades em obter financiamento e reduções injustificadas nos limites de crédito até aumentos desproporcionais nas mensalidades dos planos de saúde sem justificativa clínica”, afirma.

Ele acredita que a luta contra o etarismo econômico requer um esforço conjunto de toda a sociedade. Isso inclui governos, setor privado e a população em geral. “Somente assim poderemos assegurar que a idade avançada seja um período de dignidade e respeito, e não de limitações injustas”, opina.

Etarismo econômico reflete negação de privilégios

Segundo Janina Jacino, educadora financeira comportamental e idealizadora da Finanças sem Fronteira, mesmo o idoso que tem um histórico comportamental positivo de equilíbrio financeiro começa a observar que, com o avanço da idade, lhe são negados privilégios. Entre eles, redução do valor do crédito no cartão, menos parcelas aprovadas para a aquisição de um imóvel e outros. “Na qualidade de educadora financeira comportamental e observando o avançar da idade, vejo que 'esse novo velho' tem perfil e características que a sociedade precisa começar a observar, entender, acolher, respeitar e contribuir com essa longevidade que muito mais agrega valores à sociedade do que gera desconforto ou prejuízo”, avalia.

Ela acredita que, se o idoso for independente, lúcido e com domínio de suas faculdades mentais, o ideal é que assuma o controle de seus recursos financeiros. “Através da educação financeira comportamental, a qualquer tempo, ele pode fazer diferente do que fez até então e conquistar maior conforto financeiro. É possível!”, explica.

Um homem idoso discutindo com um homem jovem, na frente de um computador. Imagem para ilustrar a matéria sobre etarismo econômico. Crédito: fizkes/Shutterstock

Etarismo econômico também está presente no mercado de trabalho

Quando se fala em Longevidade Financeira, é fundamental lembrar que ganhar mais, ou seja, conseguir fazer renda extra, é um ponto importante. E se tratando da terceira idade, pode ser mais necessário ainda. O problema é que no mercado de trabalho também existe o etarismo econômico.

Uma pesquisa realizada pela Ernst & Young e pela agência Maturi em 2022 revelou que a maioria das empresas brasileiras ainda mantém barreiras para a contratação de trabalhadores com mais de 50 anos. Cerca de 78% das empresas admitiram preferir candidatos mais jovens.

“A experiência, que deveria ser vista como um ativo valioso, muitas vezes se transforma em um obstáculo para a reinserção profissional, limitando ainda mais a capacidade de complementar a renda”, analisa João Adolfo.

É preciso mudança cultural

O especialista acredita que, para mitigar esses desafios, é crucial a promoção de uma mudança cultural que valorize a experiência e a contribuição dos idosos. Ele também aposta na implementação de políticas públicas mais fortes que protejam seus direitos econômicos e promovam a inclusão.

“A educação financeira específica para esta fase da vida também pode ajudar a empoderar os idosos, fornecendo-lhes ferramentas para gerenciar melhor seus recursos e navegar pelo sistema financeiro com mais confiança”, diz. Além disso, ele apoia a criação de produtos e serviços financeiros adaptados às necessidades específicas dos aposentados. Ou seja, ferramentas que assegurem a esse público acesso a oportunidades de crédito justas e planos de saúde acessíveis.

Para Janina Jacino, já existe um movimento social que visa aproveitar a experiência profissional das pessoas com mais idade. Elas se lançam, inclusive, em novos cursos para se sentirem vivas, ativas e com energia e saúde. “Eu vejo e sinto que a sociedade como um todo está passando por transformações muito significativas. Entendo que é, inicialmente, tudo muito novo. Após reflexão sobre a nova “ordem social”, vem a aceitação, adequação e o investimento, principalmente em políticas públicas”, diz.

A especialista avalia que estamos vivenciando um momento sem precedentes. Todos, sem exceção, estão aprendendo a viver e conviver com essa nova ordem social. “As pessoas longevas têm um papel importantíssimo, uma vez que são elas que precisam ditar o que sentem, como sentem, suas necessidades e limitações. Para que, a partir de então, inclusive com políticas públicas sérias, eficazes e eficientes, possa se criar, preservar e agregar novos conceitos, atitudes e mudanças comportamentais para esses “novos velhos”, afirma.

Longevos precisar estar atentos aos direitos na hora de enfrentar o etarismo econômico

Em meio a um cenário desafiador para os idosos, é necessário entender que nem todas as práticas colocadas em ações no mercado são legalmente aceitáveis. Ou seja, entender os direitos previstos em lei é fundamental para lutar contra o etarismo econômico. O Estatuto do Idoso, inclusive, proíbe qualquer prática discriminatória contra a pessoa idosa.

No caso dos planos de saúde, por exemplo, a lei determina que não pode haver restrições de uso do plano em razão unicamente da idade. E as faixas de reajuste devem terminar aos 59 anos.

Com relação a cartões de crédito, o cancelamento unicamente em razão da idade também não é aceitável legalmente. Assim como a redução de limite que tenha a idade como justificativa. O mesmo acontece com relação aos juros de financiamento. Ele não podem ser superiores aos praticados no mercado em razão de faixa etária.

Outro exemplo comum relacionado ao etarismo econômico é o limite de idade para alguém ser fiador de imóvel. A lei indica que é preciso que seja uma pessoa idônea, domiciliada no município em que preste a fiança e que possua bens para cumprir a obrigação se necessário. A restrição relacionada à idade, apesar de comum, não é prevista em lei. Em caso de dúvidas, vale a pena consultar os direitos!


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